Sāṃkhya kārikā de Iśvarakṛṣṇa com comentários de Gaudapādā / Introdução
O Sāṃkhyakārikā é um dos mais antigos textos sobreviventes do Saṃkhya. A data da sua composição é desconhecida, mas sua conclusão foi estabelecida através da tradução chinesa que se tornou disponível em 569 DC. É atribuído a Ishvara Krishna (Séc. lV DC). No texto, o autor descreve-se como sucessor do grande sábio Kapila, através de Āsuri e Pañcaśikha. O Sāṃkhya Kārikā consiste de 72 versos, com o último verso afirmando que o Sāṃkhya Kārikā original tinha apenas 70 versos. O primeiro comentário importante sobre os Kārikā foi escrito por Gaudapādā (Séc. VII DC). Depois vem o Sāṃkhya Tattva Kaumudi de Vācaspati Miśra e, atualmente, o Yuktidipika, cujas edições manuscritas da era medieval foram descobertas e publicadas em meados do século XX, está entre as revisões e comentários mais significativos sobre o Saṃkhya Kārikā.
Autoria e cronologia
O Sāṃkhya é um importante pilar da tradição filosófica indiana, embora sejam disponíveis apenas três das obras originais. São elas: o Sāṃkhya Sutras atribuído ao fundador do Sāṃkhya, Kapila (texto original perdido, mas reconstruído posteriormente); o Tattva Samasa, que alguns autores (Max Muller) consideram anterior ao Sāṃkhya Sutras, e o Sāṃkhya kārikā, de autoria de Iśvarakṛṣṇa. Iśvara kṛṣṇa segue vários mestres anteriores do Sāṃkhya. Ele viveu antes de Vasubandhu sendo situado após Kapila, Āsuri e Pañcaśikha. O Sāṃkhya Kārikā foi provavelmente composto durante a era Gupta, entre 320 e 540 DC.
Gerald Larson mostra, através das análises das ideias do Sāṃkhya desenvolvidas na segunda metade do primeiro milênio AC e no período Gupta (319 a 550 DC), que o Sāṃkhya está enraizado nas especulações dos Brahmanas e dos mais antigos Upanishads do hinduísmo, e que a composição desse sistema ocorreu após os mais antigos Upanishads (cerca de 800 AC). O Sistema Sāṃkhya cresceu com desenvolvimentos posteriores, através do Bhashya sobre o Sāṃkhya Kārikā de Gaudapādā no séc. IX, e do Sāṃkhya Tattva Kaumudi de Vācaspati Miśra.
Objetivo do texto (versos 1 a 3) O Sāṃkhya Kārikā inicia afirmando que a busca da felicidade é uma necessidade básica de todos os seres humanos. No entanto, o Self é afligido por três formas de sofrimento. Por causa dos tormentos do triplo sofrimento, surge a indagação para conhecer os meios de neutralizá-lo. Diz-se que tal investigação é inútil porque existem meios perceptíveis (conhecidos) de remoção do sofrimento; Dizemos não, porque esses meios não são duradouros nem eficazes.
Sāṃkhya Kārikā (Resumo)
Verso 1: As três causas da infelicidade (ou o problema do sofrimento, o mal na vida) são 'ādhyātmika' que é natural e interna; 'ādhibhautika' que é natural e externa e, 'ādhidaivika' não natural ou sobre natural. O sofrimento é de dois tipos, do corpo e da mente. Os meios perceptíveis de tratamento incluem médicos, remédios, magia, encantamentos, conhecimento especializado da ciência moral e política, enquanto a evitação por meio de residência em locais seguros também são meios perceptíveis disponíveis. Esses meios óbvios, afirmam os estudiosos, são considerados pelo Sāṃkhya Kārikā, provisórios porque não fornecem a remoção absoluta ou final do sofrimento.
O verso 2 afirma que as escrituras também são meios visíveis disponíveis, mas também elas são, em última análise, ineficazes no alívio da tristeza e na realização espiritual, porque as escrituras lidam com a impureza, a decadência e a desigualdade. O verso então postula que "existe um método superior diferente de ambos", e este é o caminho do conhecimento e da compreensão. Mais especificamente, a libertação do sofrimento vem do conhecimento discriminativo do Vyakta (mundo em evolução, manifesto), Avyakta (mundo não-manifesto, Prakṛti) e Jña (Conhecedor, Self ou Puruṣa).
O verso 3 acrescenta que a natureza primordial (Prakṛti) é incriada; Os sete, começando com Mahat (intelecto) são criados e criativos, os dezesseis seguintes são criados e evoluem (mas não são criativos), enquanto o Puruṣa não é criado nem criativo nem evolui (simplesmente existe).
Versos 4 a 8 (meios de conhecimento): O verso 4 introduz a epistemologia do Sāṃkhya e afirma que pramana é triplo. Os caminhos confiáveis para o conhecimento correto são: percepção, inferência e o testemunho de pessoa confiável, todos os outros caminhos que levam ao conhecimento são derivados desses três. Em seguida, acrescenta que esses três caminhos podem permitir que o conheçimento dos vinte e cinco Tattvas existentes.
O verso 5 do Sāṃkhya Kārikā define percepção como o conhecimento imediato que se ganha pela interação de um órgão do sentido com qualquer coisa; a inferência, é definida como o conhecimento que se ganha baseado na reflexão sobre a percepção de algo; e testemunho como o conhecimento que se ganha dos esforços daqueles que se considera uma fonte confiável; Em seguida, afirma sucintamente que existem três tipos de inferências para a busca epistêmica do homem, sem explicar quais são esses três tipos de inferência.
O verso 6 afirma que os objetos podem ser conhecidos através dos órgãos sensoriais ou através do super-sentido (derivação interna das observações).
O verso 7 afirma que a percepção por si só não é suficiente para conhecer objetos e princípios por trás da realidade observada, certas coisas existentes não são percebidas e são derivadas.
O texto no verso 8 afirma que a existência da Prakṛti (natureza empírica, substrato material) é comprovada pela percepção, mas seus princípios sutis são não perceptíveis. A mente humana, entre outras, emerge da Prakṛti, afirma o texto, mas não é diretamente perceptível, especificamente inferida e auto-derivada. A realidade da mente e semelhantes diferem e se assemelham à Prakṛti em diferentes aspectos.
Nos versos 9 a 14 (teoria da causalidade e da doutrina dos Guṇas): O Sāṃkhya Kārikā, no verso 9, introduz sua teoria da Satkāryavāda (causalidade), afirmando que "o efeito é preexistente na causa". Aquilo que existe, tem uma causa; aquilo que não existe, não tem uma causa; e quando existe uma causa, é a semente e o anseio pelo efeito; que, uma causa produz aquilo de que é capaz. A teoria Sāṃkhya da causalidade, Satkāryavāda, é também reconhecida como a teoria do efeito existente na causa.
O verso 10 afirma que existem dois tipos de princípios operando no universo: o discreto e o não discreto. O discreto é inconstante, isolado e não permeável, mutável, suportável, fundindo, em conjunto e com um agente. O não discreto é constante, semelhante a um campo, permeável, imutável, não suportável, não emergente, separável e independente de um agente.
No verso 11, tanto o discreto quanto não discreto, são simultaneamente impregnados pelas três qualidades, e essas qualidades (guṇas) são objetivas, comuns, produtivas, não discriminam e são inatas. É nesses aspectos, afirma o Sāṃkhya Kārikā, que eles são o reverso da natureza do Self (Puruṣa) porque o Puruṣa é desprovido dessas qualidades.
O texto no verso 12 afirma que os três guṇas, isto é sattva, tamas e rajas, respectivamente correspondem ao prazer, dor e ao embotamento, mutuamente dominantes, produzem um ao outro, descansam um no outro, sempre reciprocamente presentes e trabalhando juntos. Essa teoria das qualidades do Sāṃkhya tem sido amplamente adotada por várias escolas do hinduísmo para categorizar o comportamento e os fenômenos naturais.
Os versos (13-14) afirmam que sattva é bom, esclarecedor e iluminador, rajas é movimento iminente e inquieto, enquanto tamas é escuridão, obscurecedor e angustiante; estes trabalham juntos como uma lâmpada composta de óleo, fogo e pavio, que são opostos um ao outro, trabalham juntos para iluminar objetos, assim sattva, rajas e tamas, embora opostos um ao outro, produzem um efeito.
Versos 15 a 16 (Natureza da Prakṛti): O Sāṃkhya define Prakṛti como "a natureza que evolui", e a considera a causa material do mundo empiricamente observado. Prakṛti, num contexto, tanto físico quanto psíquico, é aquilo que se manifesta como a matriz de todas as modificações. Prakṛti não é matéria primária, nem um universal metafísico, mas é a base de toda existência objetiva, matéria, vida e mente. Prakṛti tem duas dimensões, Vyakta (manifesta), e Avyakta (não manifestada). Ambas têm os três guṇas que estão em equilíbrio instável em Prakṛti Primordial; mas a presença do Puruṣa desfaz o equilíbrio original iniciando o processo evolutivo. Quando os guṇas estão em equilíbrio, nenhuma modificação ocorre; quando uma das três forças inatas torna-se mais ativa, o processo de evolução entra em ação: surge a mudança (guṇaparinama). Estes dois versos são significativos, afirma Larson, apresenta em aforismos as doutrinas da causalidade do Sāṃkhya, a relação entre vyakta e avyakta, e a doutrina do processo evolutivo.
Versos 17 a 19 (Natureza do Puruṣa): O Sāṃkhya afirma, declara Larson, que, além da criação emergente e da Prakṛti, do equilíbrio e da evolução, existe o Puruṣa (Self). O Puruṣa é a Consciência Pura, inativo, mas cuja presença perturba o equilíbrio dos três guṇas em sua condição não manifesta. Essa perturbação desencadeia o surgimento da condição manifestada da realidade empírica que experimentamos, afirma o texto.
Mais especificamente, o verso 17 oferece uma prova de que o Self existe, como segue: O Puruṣa deve existir porque: (1) Saṁghāta Parārthatvāt: O conjunto de objetos sensíveis deve servir para um propósito útil; (2) Triguṇādiviparyayād: não sofre a ação dos três guṇas; (3) Adhiṣṭhānāt: deve existir um gestor inteligente; (4) Bhoktṛbhāvāt: deve haver alguém para o desfrute, e (5) Kaivalyārtham Pravṛtteśca: há um desejo de liberação absoluta da miséria.
O verso 18 do Sāṃkhyakārikā afirma que muitos Puruṣas devem existir porque numerosos seres vivos nascem, morrem e existem; porque os guṇas estão operando e afetam a todos de maneira diferente; e porque todos são dotados de instrumentos de cognição e ação. O verso 19 afirma que o Puruṣa é a "testemunha consciente, separada, neutra, vidente e inativa".
Versos 20 a 21 (A conexão entre Prakṛti e Puruṣa). Um ser vivo é uma união de Prakṛti e Puruṣa, postula o Sāṃkhyakārikā nos versos 20-21. A Prakṛti como a inconsciente evolui, junta-se ao Puruṣa que é a consciência senciente.
O Sāṃkhya afirma que o propósito dessa união da Prakṛti e do Puruṣa, criando a realidade do universo observado, é realizar uma simbiose dupla. Uma delas, capacita o indivíduo a desfrutar e contemplar a Prakṛti e o Puruṣa através da autoconsciência; e segundo, a conjunção de Prakṛti e Puruṣa determina o caminho do Kaivalya e Moksha (libertação, liberdade).
O verso 21 menciona a metáfora do "cego e do aleijado", segundo a lenda indiana, um cego e um coxo perdidos na floresta, que se encontram, inspiram confiança mútua e, concordam em compartilhar os deveres, cego faz o andar e o coxo permite a visão, o coxo monta no soldado cego e, assim, viajam pela floresta em busca de uma saída. O Self (Puruṣa), nesta alegoria, é, similarmente, simbioticamente unido ao corpo e à natureza (Prakṛti) na jornada da vida. O Puruṣa deseja liberdade, significado e libertação, e isso pode ser alcançado através da contemplação e abstração.
Esses versos apresentam uma forma peculiar de dualismo, afirma Gerald Larson, porque eles afirmam "coisas" primitivas inconscientes por um lado, e consciência pura por outro. Isso contrasta com o dualismo apresentado em outras escolas de filosofia hindu, onde o dualismo se concentra na natureza da alma individual e de Brahman (absoluto universal).
Versos 22 a 38 (A teoria da emergência dos tattvas). Esses versos, afirma Larson, fornecem uma discussão detalhada da teoria da emergência, ié. o que emerge, como funcionam os diferentes emergentes. A discussão inclui o surgimento de buddhi (intelecto), ahaṃkāra (ego), manas (mente), os cinco buddhindriyas (órgãos sensoriais), os cinco karmendriyas (órgãos de ação), os cinco tanmātras (elementos sutis), os cinco mahabhūtas (elementos grosseiros) em seguida o texto descreve a teoria do conhecimento.
O verso 22 do Sāṃkhya Kārikā afirma que mahat (buddhi) - o grande princípio, intelecto é o primeiro produto da natureza (prakṛti), dele emerge o ego (ahaṃkāra) e o 'conjunto dos dezesseis" (discutido em versos posteriores).
Os Versos 23-25 descrevem sattva, como a força que busca a bondade, a sabedoria, a virtude, o desapego. O reverso de sattva é tamas. Sattva é a característica do intelecto. O Sāṃkhya lista os órgãos sensoriais como sendo os olhos, ouvidos, nariz, língua e pele, enquanto como órgãos de ação o aparelho fonador, mãos, pés, órgãos excretores e de procriação. A Mente, afirma o texto, é tanto um órgão sensorial em alguns aspectos, e um órgão de ação em outros aspectos. A mente pondera, é cognitiva, integra informação e depois interage com os órgãos de ação, é também modificada pelas três qualidades inatas e diversas manifestações dela. O Ego (ahaṃkāra), afirma o texto, é auto-identidade. Os órgãos sensoriais e os órgãos de ação influenciados por sattva criam a forma vaikṛta de ahaṃkāra, enquanto a influência de tamas cria o bhūtādi ahaṃkāra ou os tanmātras.
Os versos 29-30 do texto afirmam que todos os órgãos dependem do prāṇa (energia vital), e que é o prāṇa que os conecta ao invisível, o Puruṣa. As três faculdades emergentes internas, afirma o Sāṃkhya no verso 29, são mente, ego e a capacidade de raciocinar. Os órgãos sensoriais e de ação desempenham suas respectivas funções, cooperando uns com os outros, alimentados pela força vital, enquanto o Self é o observador independente.
O verso 31 do texto afirma: os órgãos manifestam o objeto e o propósito do Self, não o propósito de qualquer outra coisa.
Os veros 32 a 35 do Sāṃkhyakārikā apresentam a teoria de como os órgãos sensoriais operam e cooperam para obter informações, como os órgãos de ação apreendem e se manifestam impulsionados pela mente, ego e os três guṇas.
Os versos 36 e 37 afirmam que todos os órgãos sensoriais cooperam para apresentar informações à mente, e é a mente que apresenta conhecimentos e sentimentos ao Self (Puruṣa).
Os versos 36 e 37 afirmam que todos os órgãos sensoriais cooperam para apresentar informações à mente, e é a mente que apresenta conhecimentos e sentimentos ao Self (Puruṣa).
Versos 39 a 59 (A teoria da realidade). O Sāṃkhyakārikā nesses versos, afirma Larson, discute a teoria da realidade e como é experimentada. O texto inclui a discussão de impulsos e bhavas (disposições, desejos) que produzem a experiência humana e determinam a realidade subjetiva. O Sāṃkhya afirma que há dupla emergência da realidade, uma que é objetiva, elementar e externa; outra que é subjetiva, formulada na mente e interna. Interage com a sua teoria epistêmica do conhecimento, que é a percepção, a inferência e o testemunho de pessoa confiável, apresentando sua teoria do erro, teoria da complacência, teoria da virtude e condições necessárias para aquisição da felicidade e liberação do sofrimento.
Versos 60 a 69 (A teoria da compreensão e liberdade). O Sāṃkhyakārikā, no verso 63, afirma que a Prakṛti liga-se às sete formas (fraqueza, vício, ignorância, poder, paixão, desapego e virtude). Essa mesma natureza, uma vez consciente do objeto Puruṣa, é liberta pelo meio: conhecimento discriminativo.
O verso 64 do texto afirma que este conhecimento é obtido a partir do estudo dos tattvas, que há uma diferença entre a inerte Prakṛti e o consciente Puruṣa, a Prakṛti não é consciência, e a consciência não é escravizada pela Prakṛti. Essa consciência é "completa, livre de erros, pura e kevala (solitária)". A personalidade mais profunda do homem nos versos do Sāṃkhyakārikā, afirma Larson, não é seu ego empírico ou seu intelecto, mas sim sua Consciência, e "o conhecimento da absoluta unicidade da consciência que liberta da ilusão da escravidão e traz a mais profunda perspectiva de liberdade para o homem (kaivalya)".
Versos 70 a 72 (Transmissão da tradição Samkhya).
Saṃkhya kārikā de Iśvarakṛṣṇa com comentários de Gaudapādā / [1 - 18]
"Saudações a Kapila que, sentindo compaixão pela iminente submersão do mundo no oceano da ignorância, construiu um barco na forma de Saṃkhya para socorrer seus habitantes. Para o bem de todos, explicarei esta ciência de forma breve e clara, dando provas, razões e conclusões."
1- दुःखत्रयाभिघाताज् जिज्ञासा तदप१घातके हेतौ । दृष्टे सापार्था चेन् नैकान्तात्यन्ततोऽभावात् ॥ १॥
duḥkhatrayābhighātāj jijñāsā tadapa1ghātake hetau । dṛṣṭe sāpārthā cen naikāntātyantato'bhāvāt ॥ 1॥
अभिघात [abhighāta] (da) aflição* हेतु [hetu] causada* त्रया [traya] três (tipos de)* दुःख [duḥkha] sofrimento (interno, externo e divino)* जिज्ञासा [jijñāsā] surge o desejo de conhecer* तद् अभिघातके [tad abhighātake] (os meios de) sua remoção* चेत् सा [cet sā] se a investigação* अपार्था [apārthā] (é) inútil* घ्ष्ट [dṛṣṭa] (por causa da existência) de meios reconhecidos* न [na] (respondemos) não* एकान्त अत्यङ्ततः अभावात् [ekānta atyantataḥ abhāvāt] porque esses meios não são eficazes nem duradouros*
1- Da aflição causada pelos três tipos de sofrimento (interno, externo e divino), surge o desejo de conhecer os meios de sua remoção. Se a investigação é inútil por causa da existência de meios perceptíveis bem conhecidos, respondemos não, porque esses meios não são eficazes nem duradouros.
Gauḍapāda: A explicação desta estrofe em métrica āryā sobre os três tipos de dor é a seguinte: O divino Kapila, certamente, filho de Brahma, pois diz-se que, "Sanaka, Sanandana e Sanātana o terceiro; Āsuri, Kapila, Bohru e Pañcaśikha: esses sete filhos de Brahma foram denominados grandes sábios".
Virtude, conhecimento, renúncia e poder nasceram com Kapila. Nascido assim, vendo este mundo afundar na escuridão ofuscante e a sucessão de samsāra (nascimento e morte), ele se encheu de compaixão e ensinou esse conhecimento de vinte e cinco princípios ao brâmane Āsuri, nascido em sua própria família - o conhecimento pelo qual a miséria chega ao fim. “Aquele dotado com o conhecimento dos vinte e cinco princípios, sem dúvida, obterá a salvação, não importa em que estágio da vida ele esteja - se ele tem cabelo emaranhado, raspado ou preso no topo.”
A indagação é consequência do sofrimento causado pelos três tipos de dor. Aqui, os três tipos de dor são (ādhyātmika) natural e interno; 2. (ādhibhautika) natural e externo; e 3. (ādhidaivika) não natural ou sobrenatural. O primeiro é de dois tipos, corporal e mental. A miséria corporal é fluxo nasal, febre ou algo semelhante, que surge da desordem do vento, da bile ou da fleuma; A mental é a separação do que é apreciado, a aproximação do que não é apreciado. A miséria externa, mas natural, é quadruplicada, de acordo com a agregação da matéria elementar de onde provém; isto é, é produzida por quaisquer seres criados, vivíparos, ovíparos, gerados pelo calor e pela umidade, ou brotando do solo; ou em suma, por homens, bestas, aves domesticadas ou selvagens, répteis, mosquitos, piolhos, insetos, peixes, jacarés, tubarões, árvores, pedras, etc. O terceiro tipo de dor pode ser chamado de super-humano, daivika, quer seja divino ou atmosférico: no segundo caso, significa dor que provém do frio, do calor, do vento, da chuva, dos raios e de coisas semelhantes.
No que, então, deve ser feita a investigação que é motivada, pela miséria causada pelos três tipos de dor? "Sobre os meios de excluí-los". Esta é a pergunta. "Nem é uma pergunta supérflua". Se essa indagação for (considerada) supérflua, isto é, porque existem meios óbvios (bem conhecidos) de remover a dor tripla: Como por exemplo; para aliviar os dois tipos internos de dor são óbvios, por meio da aplicação da ciência médica, como por decocções pungentes, amargas e adstringentes, ou pela remoção daqueles objetos não apreciados, e adesão aos apreciados; Também, a óbvia obstrução da dor por causas naturais externas é a proteção e similares. Esses meios óbvios, afirmam os sábios, são considerados pelo Samkhyakarika temporários porque eles não fornecem a remoção absoluta ou final do sofrimento. Portanto, a investigação deve ser feita em outra instancia para descobrir os meios que definitivamente e finalmente acabam com o sofrimento.
2- दृष्टवदानुश्रविकः स ह्यविशुद्धि क्षयातिशययुक्तः । तद्विपरीतः श्रेयान् व्यक्ताव्यक्तज्ञविज्ञानात् ॥ २॥
dṛṣṭavadānuśravikaḥ sa hyaviśuddhi kṣayātiśayayuktaḥ । tadviparītaḥ śreyān vyaktāvyaktajñavijñānāt ॥ 2॥
सः आनु श्रविकः हि दृष्टवत् [saḥ ānu śravikaḥ hi dṛṣṭavat] os meios revelados são os mais evidentes* अविशुद्धि क्षया अतिशय युक्तः [aviśuddhi kṣayā atiśaya yuktaḥ] mas estão ligados à impureza, à decadência e à discordância* तत् विपरीतः श्रेयान् व्यक्ताः अव्यक्त ज्ञ विज्ञानात् [tat viparītaḥ śreyān vyaktāḥ avyakta jña vijñānāt] (por isso) é melhor proceder do conhecimento discriminativo entre o manifesto (vyakta), o não-manifesto (avyakta) e o conhecedor (jña)*
2- Os meios revelados (escrituras) são os mais evidentes, mas estão ligados à impureza, à decadência e à discordância. Por isso, é melhor proceder do conhecimento discriminativo entre o manifesto (vyakta), o não-manifesto (avyakta) e o conhecedor (jña).
Gauḍapāda: O revelado é como o evidente porque está ligado à impureza, destruição e desigualdade. Embora o Dharma seja prescrito pelos Śrutis e os Smrtis, ainda por causa da mistura de itens, é cheio de impureza. Além dissso, “em cada yuga milhares de Indras e deuses foram superados pelo tempo. Isto é, portanto, insuperável ”. Assim, está ligado à destruição, por causa da destruição de Indra e outros. Mais uma vez, é dotado de atiśaya, desigualdade devido à superioridade. Por superioridade em um, o outro sente dor. Assim, os meios revelados são como os evidentes. Além dos meios revelados e evidentes, há a cognição correta do manifesto, do não manifesto e do Conhecedor. O manifesto é Mahat (Buddhi) e o resto, isto é, intelecto, ego, os cinco elementos sutis, os onze órgãos dos sentidos, incluindo a mente, e os cinco elementos densos. O não manifesto é o Pradhāna. O conhecedor é o Puruṣa . Assim, esses vinte e cinco Tattvas são chamados o manifesto, o não manifesto e o Conhecedor. Em sua cognição correta está a preferência sobre os outros meios. Agora, quais são as características especiais do manifesto, do não manifesto e do Conhecedor?
3- मूलप्रकृतिरविकृतिर्महदाद्याः प्रकृतिविकृतयः सप्त । षोडशकस्तु विकारो न प्रकृतिर्न विकृतिः पुरुषः ॥ ३॥
mūlaprakṛtiravikṛtirmahadādyāḥ prakṛtivikṛtayaḥ sapta । ṣoḍaśakastu vikāro na prakṛtirna vikṛtiḥ puruṣaḥ ॥ 3॥
मूलप्रकृतिः अविकृतिः [mūlaprakṛtiḥ avikṛtiḥ] mūlaprakṛti substrato material (em oposição ao pradhāna que é seu estado subsequente quando os guṇas entram em ação) é inalterável* सप्त महदाद्याः [sapta mahadādyāḥ] os sete mahat etc. (mahat, ahamkara, e os cinco tanmatras)* प्रकृतिविकृतयः [prakṛtivikṛtayaḥ] são evoluídos e evolutivos* षोडशकः [ṣoḍaśakaḥ] os dezesseis (manas, cinco jnanendriyas, cinco karmendriyas, e os cinco mahabhutas)* तु विकारः [tu vikāraḥ] são evoluídos* पुरुषः न विकृतिः न प्रकृतिः [puruṣaḥ na vikṛtiḥ na prakṛtiḥ] o puruṣa não é evoluído nem evolutivo*
3- Mūlaprakṛti, substrato material, em seu estado original (em oposição ao Pradhāna que é seu estado subsequente quando os Guṇas entram em ação) é inalterável; Os sete (mahat ou buddhi, ahamkara, e os cinco tanmatras) são evoluídos e evolutivos; Os dezesseis (manas, os cinco jnanendriyas, os cinco karmendriyas, e os cinco mahabhutas) são evoluídos; o Puruṣa não é evoluído nem evolutivo.
Gauḍapāda: Um evolutivo é aquele que causa evolução e um evoluído é o resultado. Natureza Primal (substrato material), pradhāna é assim chamado porque é a origem dos sete evolutivos e dos dezesseis evoluídos. É a origem e um não produto. É apenas evolutivo, já que não é produzido de nenhuma outra fonte. Mahat, intelecto, ego e os cinco elementos sutis (tanmātras) são evoluídos e evolutivos. Isto é, o intelecto é produzido a partir de Prakṛti e é, portanto, um produto da natureza primordial, um evoluído. O mesmo intelecto produz o ego e é, portanto, também um evolutivo. O ego, sendo produzido a partir do intelecto, é igualmente evoluído, e é evolutivo, pois produz os cinco elementos sutis: som, tato, visão, olfato e paladar. Mahat e o resto dos sete são evoluídos e evolutivos. Os elementos sutis são as evoluções do ego e cada um deles evolui para cada um dos elementos densos: espaço, ar, fogo, água e terra, respectivamente. Os cinco órgãos dos sentidos, os cinco órgãos da ação, a mente e os cinco elementos grosseiros - são apenas evolutivos. Todos eles são produtos conhecíveis. Neste mundo, os conhecíveis são provados por meios tangíveis, como o arroz pelo seu peso e uma sandália pelo seu equilíbrio. Portanto, ao defini-los, os meios de cognição devem ser definidos. O Puruṣa não é nem evoluído nem evolutivo.
4- दृष्टमनुमानमाप्तवचनं च सर्वप्रमाणसिद्धत्वात् । त्रिविधं प्रमाणमिष्टं प्रमेयसिद्धिः प्रमाणाद्धि ॥ ४॥
dṛṣṭamanumānamāptavacanaṃ ca sarvapramāṇasiddhatvāt । trividhaṃ pramāṇamiṣṭaṃ prameyasiddhiḥ pramāṇāddhi ॥ 4॥
दृष्ट अनुमान च आप्तवचन सर्व प्रमाण [dṛṣṭa anumāna ca āptavacana sarva pramāṇa] percepção inferência e testemunho válido (são os meios para estabelecer) todo o conhecimento correto)* त्रिविधं सिद्धत्वात् [trividhaṃ siddhatvāt] (assim os meios) corretos de cognição estão incluídos nestes três* हि प्रमेयसिद्धिः प्रमाणम् इष्टं प्रमाणात् [hi prameyasiddhiḥ pramāṇaṃ iṣṭaṃ pramāṇāt] de fato um provável é provado por meio da cognição correta*
4- Percepção, inferência e testemunho válido são os meios para estabelecer todo o conhecimento correto; assim os meios corretos de cognição estão incluídos nestes três. De fato, um provável é provado por meio da cognição correta.
Gauḍapāda: O meio da cognição correta é chamado de percepção. Percebemos através dos cinco órgãos do sentido - o ouvido, a pele, o olho, a língua e o nariz. Som, tato, visão, paladar e olfato, respectivamente, são os cinco objetos do sentido. O ouvido compreende som; a pele, toque; o olho, forma; a língua, gosto; o nariz, cheiro. Um objeto que não pode ser apreendido pela percepção ou inferência é compreendido através de um testemunho válido. Além disso, é dito que a escritura é um testemunho válido. Uma pessoa é confiável quando está livre de defeitos. Aquele que é livre de defeitos não dirá mentira, porque não há ocasiões para isso. Aquele que está envolvido em seus deveres está livre de apego e aversão, e é sempre respeitado por pessoas como ele. Essa pessoa é conhecida por ser confiável.
Todos os outros meios de cognição estão incluídos nesses três. Jaimini (mīmāṃsā) discute seis meios de cognição correta: pressuposição, probabilidade, negação, imaginação, tradição e analogia. Esses seis meios de cognição correta estão incluídos nos três indicados aqui. A suposição é compreendida pela inferência. Probabilidade, negação, imaginação, tradição e analogia são compreendidas por um testemunho válido. Portanto, todos os outros meios da cognição correta estão incluídos nesses três meios de cognição correta.
As coisas a serem provadas são, a natureza primordial (Prakṛti), o intelecto, o ego, os cinco elementos sutis, os onze órgãos dos sentidos, os cinco elementos densos e o Puruṣa. Essas vinte e cinco categorias (Tattvas) são chamadas de manifesto, não manifesto e Conhecedor. Destes, alguns devem ser provados por meio da percepção, alguns por inferência e alguns por testemunho válido. Estes são os três meios de cognição correta.
5- प्रतिविषयाध्यवसायो दृष्टं त्रि१विधमनुमानमाख्यातम् । तल्लिङ्गलिङ्गिपूर्वकमाप्तश्रुतिराप्तवचनं तु ॥ ५॥
prativiṣayādhyavasāyo dṛṣṭaṃ tri1vidhamanumānamākhyātam । talliṅgaliṅgipūrvakamāptaśrutirāptavacanaṃ tu ॥ 5॥
दृष्ट प्रति विषय अध्यवसाय [dṛṣṭa prati viṣaya adhyavasāya] a percepção é a aplicação (dos sentidos) a seus objetos específicos* अनुमान आख्यात त्रिविध [anumāna ākhyāta trividha] a inferência é reconhecida com três partes* पूर्वकम् तत् लिङ्ग लिङ्गि [pūrvakam tat liṅga liṅgi] é precedida pelo conhecimento do termo principal (lingin) e do termo médio (linga)* तु आप्तश्रुति आप्तवचन [tu āptaśruti āptavacana] e, da tradição confiável do testemunho válido (āptavacana)*
5- Percepção (Dṛṣṭa) é a aplicação dos sentidos a seus objetos específicos; A inferência (anumāna) é composta por três partes: é precedida pelo conhecimento de linga (termo médio) e o lingin (termo principal) e, da tradição confiável do testemunho válido (Āptavacana).
Gauḍapāda: Drsta ou percepção é a aplicação dos sentidos, ouvidos e o resto, aos seus objetos especiais, som e o resto.
A inferência apresenta três formas: pūrvavat (inferir um efeito não percebido de uma causa percebida), śesavat (inferir uma causa não percebida de um efeito percebido) e sāmānyatodrsta (quando a inferência não é baseada na causação, mas na uniformidade da coexistência). Aquilo que é inferido de uma causa antecedente é chamado pūrvavat. Por exemplo, alguém infere a chuva ao ver uma nuvem crescente de umidade, como já foi visto antes. Śesavat é entendido pelo exemplo de encontrar uma pequena quantidade de água salgada no mar e inferir que o resto da água é, também, salgada. Um exemplo de sāmānyatodrsta é quando se observa que a lua e as estrelas se movem de um lugar para outro e se infere que há locomoção. Da mesma forma, ao observar uma mangueira em flor em um determinado lugar, pode-se inferir que as mangueiras florescem em outros lugares.
Além disso, a inferência é precedida pelo conhecimento de linga (termo médio) e da lingin (o termo principal). Linga é uma marca ou sinal de alguma coisa. A inferência é precedida pelo conhecimento do termo médio, em que um termo principal é inferido por meio de um termo médio. Por exemplo, ao ver uma tigela na mão, o possuidor é inferido como sendo um mendicante. Quando precedido por um termo importante, um termo médio pode ser inferido pela observação do termo principal. Usando o mesmo exemplo, ao ver um mendicante, pode-se inferir que a tigela pertence a ele.
O testemunho válido consiste em ensinamentos e revelações sagradas. Assim, três tipos de meios de cognição correta foram definidos. Agora é explicado o que deve ser provado por meio da cognição correta:
6- सामान्यतस्तु दृष्टादतीन्द्रियाणां प्रतीतिर१नुमानात् । तस्मादपिचासिद्धं परोऽक्षमाप्तागमात् सिद्धं२ ॥ ६॥
sāmānyatastu dṛṣṭādatīndriyāṇāṃ pratītira1numānāt । tasmādapicāsiddhaṃ paro'kṣamāptāgamāt siddhaṃ ॥ 6॥
तु सामान्य दृष्ट [tu sāmānya dṛṣṭa] (por meio da inferência baseada na analogia (sāmānya)* अतीन्द्रिय प्रतीति तस्मात् अनुमान [atīndriya pratīti tasmāt anumāna] os objetos além dos sentidos são provados* अपि च असिद्ध परीक्षा [api ca asiddha parīkṣā] aquilo que não é provado por essa inferência e não pode ser percebido diretamente* आप्त आगमात् सिद्ध [āpta āgamāt siddha] deve ser provado por um testemunho válido (āptavacana)*
6- Por meio da inferência baseada na analogia (sāmānya), os objetos além dos sentidos são provados; aquilo que não é provado por essa inferência e não pode ser percebido diretamente, deve ser provado por um testemunho válido (āptavacana).
Gauḍapāda: O manifesto é provado pela percepção direta. Por meio de inferência baseada em analogia, são provados os objetos além dos sentidos, ou seja, objetos que não podem ser percebidos diretamente pelos sentidos. Prakṛti e Puruṣa, que estão além da percepção sensorial, são provados por inferência baseada em analogia. Mahat e o resto se expressam por três guṇas. A Prakṛti é a causa de mahat e do resto, que possui os três guṇas. E, porque esta Prakṛti inconsciente parece estar consciente, deve ter outro Self consciente para superintendê-la.
Aquilo que não é provado por essa inferência e não pode ser percebido diretamente é provado por um testemunho válido. Por exemplo, as divindades são imperceptíveis e são comprovadas por testemunhos válidos.
Alguém pode dizer que a Prakṛti e o Puruṣa não são percebidos e que o que não é percebido neste mundo não existe, portanto a Prakṛti e o Puruṣa não existem. A resposta é que neste mundo a não percepção da Prakṛti e do Puruṣa não implica que eles não existam. O que é conhecido no efeito deve estar na causa.
7- अतिदूरात् सामीप्यादिन्द्रियघातान् मनोऽनवस्थानात् । सौक्ष्म्याद् व्यवधानादभिभवात् समानाभिहारच्च ॥ ७॥
atidūrāt sāmīpyādindriyaghātān mano'navasthānāt । saukṣmyād vyavadhānādabhibhavāt samānābhihāracca ॥ 7॥
अतिदूर [atidūra] (por conta da) distância excessiva* सामीप्य [sāmīpya] proximidade* इन्द्रिय घात [indriya ghāta] deficiência sensorial* मनस् अनवस्थान [manas anavasthāna] mente ausente (desatenção)* सौक्ष्म [saukṣma] sutileza* व्यवधान [vyavadhāna] obstrução* अभिभव [abhibhava] supressão (por outros)* च [ca] e* समान अभिहार [samāna abhihāra] mistura com objetos similares (nem os objetos existentes são percebidos)*
7- Por conta da distância excessiva, proximidade, deficiência sensorial, desatenção, sutileza, obstrução, supressão e mistura com o que é similar, (nem os objetos existentes são percebidos).
Gauḍapāda: Aqui, mesmo os objetos existentes não são percebidos por conta da distância excessiva, por exemplo, alguém que vive em outro país. Por causa da proximidade - o olho não consegue perceber o líquido em si. Por causa da lesão dos sentidos - os surdos e cegos não percebem o som ou a cor. Por causa da desatenção - um homem que está distraído não ouve nada, por mais que seja dito. Por causa da pequenez - os átomos de fumaça, calor, água e geada não são visíveis no céu. Por causa da obstrução - um objeto obstruído por uma parede é invisível. Por causa da supressão - os planetas e as estrelas são invisíveis devido à supressão de sua luz pelo sol. Por causa da mistura com o que é similar - um grão de feijão em um monte de feijão, ou um pombo específico em um bando de pombos, são invisíveis porque são misturados com o que é similar. Assim, os objetos existentes não são percebidos neste mundo por causa de oito causas. O que é verificado existe. Agora, é explicado porque não há percepção de Prakṛti e do Puruṣa e como eles podem ser apreendidos.
8- सौक्ष्म्यात् तदनुपलब्धिर्नाभावात् कार्यतस्तदुपलब्धिः । महदादि तच्च कार्यं प्रकृतिविरूपं सरूपं च ॥ ८॥
saukṣmyāt tadanupalabdhirnābhāvāt kāryatastadupalabdhiḥ । mahadādi tacca kāryaṃ prakṛtivirūpaṃ sarūpaṃ ca ॥ 8॥
तत् अनुपलब्धि [tat anupalabdhi] a não percepção (da prakṛti)* सौक्ष्म्य [saukṣmya] é por causa de sua sutileza* ना अभाव [na abhāva] não à sua inexistência* तत् उपलब्धि कार्यतस् [tat upalabdhi kāryatas] é percebida pelos seus efeitos* तत् च कार्यं महत् आदि [tat ca kāryaṃ mahat ādi] esses efeitos são mahat e o resto* विरूप च सरूप् प्रकृतिय [virūpa ca sarūpya prakṛti] (alguns são) diferentes e outros semelhantes à prakṛti*
8- A não percepção de Prakṛti é devida à sua sutileza e não à sua inexistência. É determinada pelos seus efeitos. Esses efeitos são Mahat (Buddhi) e o resto; alguns são diferentes e outros semelhantes à Prakṛti.
Gauḍapāda: A Prakṛti não é apreendida por causa da sutileza. Como os átomos existentes de fumaça, calor, água e gelo que são invisíveis no céu. Então, como ela é percebida? É percebida pelos seus efeitos. Uma causa é inferida da observação de um efeito. A Prakṛti, como causa, existe e seus efeitos são o intelecto, o ego, os cinco elementos sutis, os onze órgãos e os cinco elementos grosseiros. Eles são o efeito dessa Prakṛti. Esses efeitos são diferentes e semelhantes à Prakṛti. Mesmo no mundo, um filho é semelhante e diferente de seu pai. As causas da semelhança e dissimilaridade, explicaremos mais adiante.
Por causa da discordância entre os estudiosos, há dúvidas sobre se esses efeitos são existentes ou inexistentes em sua causa. Pois nesta escola de filosofia (Sāṃkhya), o efeito é existente. Dentro do Budismo, é inexistente. Se existir, não pode ser inexistente. Se, no entanto, é inexistente, então não pode existir. Esta é uma aparente contradição. Assim foi dito:
9- असदकरणादुपादानग्रहणात् सर्वसम्भवाभावात् । शक्तस्य शक्यकरणात् कारणभावाच्च सत्कार्यम् ॥ ९॥
asadakaraṇādupādānagrahaṇāt sarvasambhavābhāvāt । śaktasya śakyakaraṇāt kāraṇabhāvācca satkāryam ॥ 9॥
सत् कार्य [ca sat kārya] o efeito é existente (porque:)* असत् अकरण [asat akaraṇa] o que é inexistente não pode ser produzido* उपादान ग्रहण [upādāna grahaṇa] porque o efeito requer uma causa material específica* अभाव सर्व संभव [abhāva sarva saṃbhava] porque um efeito não é produzido de várias causas* शक्तस्य शक्यकरण [śaktasya śakyakaraṇa] porque uma causa eficiente pode produzir apenas aquilo para o qual é eficiente* च [ca] e* कारण भाव [kāraṇa bhāva] porque o efeito é da mesma essência que a causa*
9- O efeito é existente, porque: (1º) O que é inexistente não pode ser produzido (asat akaraṇa); (2º) Porque o efeito requer uma causa material específica (upādāna grahaṇa); (3º) Porque um efeito não é produzido de várias causas (abhāva sarva saṃbhava); (4º) Porque uma causa eficiente pode produzir apenas aquilo para o qual é eficiente (śaktasya śakyakaraṇa); e, (5º) Porque o efeito é da mesma essência que a causa (kāraṇa bhāva).
Gauḍapāda: Não existente é o que não existe. Como não pode haver produção de algo inexistente, um efeito deve existir dentro de sua causa. Neste mundo não vemos qualquer produção de um objeto inexistente, já que o óleo não pode ser produzido a partir da areia, onde o óleo é inexistente. Como somente um objeto existente pode ser produzido, a manifestação deve existir antes de sua produção na Prakṛti. O efeito é existente. Além disso, neste mundo um homem seleciona a causa material daquilo que ele quer. Aquele que quer coalhada seleciona leite e não água. Portanto, o efeito existe dentro de sua causa. Tudo não pode ser produzido a partir de qualquer coisa. Por exemplo, o ouro não pode ser produzido a partir de prata, grama, poeira e areia. Portanto, o efeito é existente e específico, porque tudo não pode ser produzido de qualquer lugar. Uma coisa poderosa pode produzir aquilo de que é capaz. Aqui vemos que apenas uma coisa potente, como o oleiro e os meios de terra, roda e água, pode produzir um pote da terra, um pote que é capaz de ser produzido. Portanto, o efeito é existente. O efeito é da mesma natureza que a causa. Farinha de cevada é produzida a partir de cevada e farinha de arroz a partir de arroz. Se o efeito não existisse, então a farinha de arroz poderia ser produzida a partir da cevada, mas não é assim, portanto, o efeito é existente. Assim, existem cinco causas que provam a existência do emergente, Mahat e o resto, na Prakṛti. Portanto, está provado que apenas o que existe é produzido e não é inexistente. Agora ele explica a semelhança e dissimilaridade de Mahat e o resto com a Prakṛti.
10- हेतुमदनित्यमव्यापि सक्रियमनेकमाश्रितं लिङ्गम् । सावयवं परतन्त्रं व्यक्तं विपरीतमव्यक्तम् ॥ १०॥
hetumadanityamavyāpi sakriyamanekamāśritaṃ liṅgam । sāvayavaṃ paratantraṃ vyaktaṃ viparītamavyaktam ॥ 10॥
व्यक्त [vyakta] o manifestado* हेतुमत् [hetumat] depende de uma causa* अनित्य [anitya] não eterno* अव्यापिन् [avyāpin] não pervasivo* सक्रिय [sakriya] ativo* अनेक [aneka] múltiplo* आश्रित [āśrita] dependente* लिङ्ग [liṅga] é dotado da característica de fusão* सावयव [sāvayava] composto de partes* परतन्त्र [paratantra] subordinado* अव्यक्त [avyakta] o não manifestado* विपरीत [viparīta] é o oposto*
10- O manifesto (vyakta) é causado, não eterno, não pervasivo, ativo, múltiplo, dependente, é dotado da característica de fusão, composto de partes e subordinado. O não manifesto (avyakta) é exatamente o oposto.
Gauḍapāda: O manifesto e os efeitos em mahat e no resto são causados. O manifesto tem a Prakṛti como sua causa. Portanto, toda a manifestação até os cinco elementos grosseiros é causada. O princípio do intelecto é causado pela Prakṛti; o princípio do ego é causado pelo intelecto; os cinco elementos sutis e os onze órgãos são causados pelo ego; o espaço é causado pelo elemento sutil do som; o vento é causado pelo elemento sutil do toque; a luz é causada pelo elemento sutil da forma; a água é causada pelo elemento sutil do sabor; a terra é causada pelo elemento sutil do olfato. Assim, toda a manifestação até os cinco elementos grosseiros é causada. Mais uma vez, não é eterno porque é produzido a partir de outro. Por exemplo, um jarro não é eterno porque é produzido a partir de um pedaço de argila. Mais uma vez, é não permeável, isto é, não é todo impregnante. O manifesto não é todo permeável como a Prakṛti e o Puruṣa são. Mais uma vez, está ativo. Migra no momento da criação porque migra junto com o corpo sutil dotado de treze instrumentos, é ativo. Mais uma vez, é múltiplo. Há muitas partes - intelecto, ego, os cinco elementos sutis, os onze órgãos e os cinco elementos grosseiros. Mais uma vez, depende da sua causa. O intelecto depende da Prakṛti; o ego depende do intelecto; os onze órgãos e os cinco elementos sutis dependem do ego; e os cinco elementos grosseiros dependem dos cinco elementos sutis. Mais uma vez, é fusível. É dotado da característica de fusão. No período de dissolução, os cinco elementos grosseiros se fundem em cinco elementos sutis; o último junto com os onze órgãos se fundem no ego; o ego se funde no intelecto; e o intelecto se funde na Prakṛti. Mais uma vez, está em conjunção. É composto de partes. Som, tato, paladar, cor e olfato são as partes que o compõem. Mais uma vez, é subordinado. Não é independente. Como o intelecto é subordinado à Prakṛti; o ego é subordinado ao intelecto; os cinco elementos sutis e os onze órgãos estão subordinados ao ego; e os cinco elementos brutos estão subordinados aos cinco elementos sutis. Assim, o manifesto que é subordinado e dependente de outro é explicado.
Agora, vamos descrever o não manifesto. O não manifesto é exatamente o oposto dessas características. O manifesto foi descrito como causado. Não há nada mais alto que a Prakṛti. E como a Prakṛti não é produzida, o não manifesto é sem causa. Da mesma forma, o manifesto não é eterno; o não manifesto é eterno porque não é produzido. Não é produzido a partir de nada como os elementos densos. Então é eterno. Além disso, o manifesto não é permeável; o não manifesto é onipresente, sendo onipresente. O manifesto está ativo; o não manifesto está inativo, também por causa da onipresença. O manifesto é múltiplo; o não manifesto é um, porque é a causa. O não manifesto é a única causa de todos os três mundos; portanto, a Prakṛti é uma só. Mais uma vez, o manifesto é dependente; o não manifesto é independente, sendo um não efeito. Não há nada mais elevado que a Prakṛti, da qual a Prakṛti possa ser um efeito. Novamente, o manifesto é fundível; o não manifesto é não confluente, porque é eterno. É Uma fusão, o mahat e todos os evoluídos fundem-se uns aos outros no momento da dissolução. Mas a Prakṛti não é assim. Portanto, a Prakṛti não é uma fusão. Mais uma vez, o manifesto está em conjunção; o não manifesto é sem partes. Som, toque, gosto, cor e cheiro não existem na Prakṛti. Mais uma vez, o manifesto é subordinado; o não manifesto é não subordinado. É o seu próprio mestre. Assim, a dissimilaridade entre o manifesto e o não manifesto foi descrita. Agora, a semelhança entre os dois é explicada como foi dito que, o manifesto, também é semelhante à natureza causal.
11- त्रिगुणमविवेकि विषयः सामान्यमचेतनं प्रसवधर्मि । व्यक्तं तथा प्रधानं तद्विपरीतस्तथा च पुमान् ॥११॥
triguṇamaviveki viṣayaḥ sāmānyamacetanaṃ prasavadharmi । vyaktaṃ tathā pradhānaṃ tadviparītastathā ca pumān ॥11॥
व्यक्त [vyakta] o manifesto* तथा [tathā] como também* प्रधान [pradhāna] pradhāna (substrato material)* त्रिगुण [triguṇa] (é composto pelos) três guṇas* अविवेक [aviveka] (é) não discriminado* विषय [viṣaya] relacionado aos objetos* सामान्य [sāmānya] comum* अचेतन [acetana] inconsciente* प्रसव धर्मिन् [prasava dharmin] produtivo* पुमान् [pumān] puruṣa* च तथा [ca tathā] similar em alguns aspectos* तत् विपरित [tat viparita] é seu reverso*
11- O manifesto, como Pradhāna (substrato material), é composto pelos três Guṇas, é não discriminado, relacionado aos objetos, comum, inconsciente e produtivo. O Puruṣa, similar em alguns aspectos, é seu reverso.
Gauḍapāda: O manifesto é composto dos três guṇas. O manifesto é não discriminado. Isto é, é desprovido de discriminação. Não é possível discriminar entre os dois, o manifesto e seus guṇas, como podemos fazer no caso de um touro e um cavalo. Mais uma vez, o manifesto é objetivo; isto é, é um objeto de prazer, porque é um objeto de prazer para todos os puruṣas. Novamente, o manifesto é geral porque é comum a todos os Puruṣas e é usado por todos.
O manifesto não é inteligente. Não é consciente de prazer, dor e ilusão. Mais uma vez, o manifesto é produtivo. Por exemplo, do intelecto, o ego é produzido; do ego, os cinco elementos sutis e os onze órgãos são produzidos; dos cinco elementos sutis, os cinco elementos densos são produzidos. Assim, essas características do manifesto que termina com a produtividade foram descritas. O não-manifesto é semelhante nessas características. Como o manifesto é, também é a Pradhāna. O manifesto é composto dos três guṇas; o não-manifesto, cujos produtos, mahat e o resto, são compostos dos três guṇas, também é composto dos três guṇas. Neste mundo, o efeito tem a mesma essência da causa. Por exemplo, um pedaço de pano tecido com fios pretos será preto.
Mais uma vez, o manifesto não é discriminado. A Pradhāna também não pode ser discriminada dos três guṇas. Não é possível discriminar que a Pradhāna é diferente dos três guṇas; então a Pradhāna não é discriminada. Novamente, o manifesto é objetivo e a Pradhāna também é objetiva porque é um objeto de prazer para todos os Puruṣas. Mais uma vez, o manifesto é geral. Assim também a Pradhāna é comum a todos. Mais uma vez, o manifesto não é inteligente. A Pradhāna também não é consciente do prazer, da dor e da ilusão. Como podemos inferir isso? Vemos que, a partir de um pedaço não-inteligente de argila, é produzido um jarro insensível.
Assim, a Pradhāna foi descrita. Agora, vamos explicar como o Puruṣa é o inverso disso e também similar. O Puruṣa como o reverso é o reverso do manifesto e do não-manifesto. O manifesto e o não-manifesto são compostos dos três guṇas; Puruṣa é sem guṇas. O manifesto e o não-manifesto são não-discriminados; Puruṣa é discriminador. O manifesto e o não manifesto são objetivos; O Puruṣa é não objetivo. O manifesto e o não manifesto são gerais; O Puruṣa é não geral (individual).
O manifesto e o não manifesto não são inteligentes; O Puruṣa é consciente do prazer, da dor e da ilusão; conhece-os; portanto Puruṣa, é inteligente. O manifesto e a Pradhāna são produtivos; O Puruṣa é improdutivo. Nada é produzido do Puruṣa. Portanto, diz-se que o Puruṣa é o inverso disso.
Quanto à observação de que o Puruṣa é semelhante a isso, foi explicado no verso anterior como a Pradhāna é sem causa, assim como o Puruṣa. Foi dito que o manifesto é causado, não eterno e assim por diante, o não manifesto é o reverso disso. Aqui, o manifesto é causado; o não manifesto é sem causa; e assim é o Puruṣa não causado porque não é produzido. O manifesto não é eterno; o não manifesto é eterno; assim também é o Puruṣa eterno. O manifesto é não penetrante; o não manifesto está impregnado; assim também é o Puruṣa que permeia a onipresença. O manifesto está ativo; o não manifesto está inativo; assim também é Puruṣa inativo, mais uma vez porque é onipresente. O manifesto é múltiplo, o não manifesto é um; assim também é Puruṣa o Um. O manifesto é dependente; o não manifesto é independente, assim também é independente do Puruṣa. O manifesto é uma fusão; o não manifesto é não fundível; assim também é o Puruṣa não fundível porque não se funde em nenhum lugar. O manifesto está em conjunção; o não manifesto é não conjunto; assim também é Puruṣa não conjunto. Não há partes nas formas do som e o resto no Puruṣa. E novamente, o manifesto é subordinado; o não manifesto é não subordinado; assim também é o Puruṣa não subordinado. É o seu próprio mestre. Assim, a semelhança do não manifesto com o Puruṣa foi explicada no verso anterior. No verso atual, “Composto dos guṇas, não discriminados…” a semelhança do manifesto com a Pradhāna e a dissemelhança com o Puruṣa foram explicadas.
12- प्रीत्यप्रीतिविषादात्मकाः प्रकाशप्रवृत्ति१नियमार्थाः । अन्योऽन्याभिभवाश्रय जननमिथुनवृत्तयश्च गुणाः ॥ १२॥
prītyaprītiviṣādātmakāḥ prakāśapravṛtti1niyamārthāḥ । anyo'nyābhibhavāśraya jananamithunavṛttayaśca guṇāḥ ॥ 12॥
गुण आत्मक प्रीति अप्रीति विषाद [guṇa ātmaka prīti aprīti viṣāda] os três gunas são) da natureza de prazer dor ilusão* आर्थ प्रकाश प्रवृत्ति नियम [ārtha prakāśa pravṛtti niyama] (servem) para o propósito de iluminação ação e contenção* च अन्योन्य अभिभव आश्रय जनन मिथुनवृत्ति [ca anyonya abhibhava āśraya janana mithunavṛtti] e são mutuamente dominadores apoiadores produtivos e cooperativos*
12- Os Guṇas são da natureza do prazer (sattva), da dor (rajas) e da ilusão (tamas); eles servem ao propósito de iluminação, ação e contenção, e são mutuamente dominadores, apoiadores, produtivos e cooperativos.
Gauḍapāda: Os Guṇas: sattva, rajas e tamas são da natureza do prazer, da dor e da ilusão. Sattva é da natureza do prazer. Rajas é da natureza da dor. Tamas é da natureza da ilusão. Mais uma vez, eles são adaptados para iluminar, ativar e restringir. A palavra artha significa "competência". Prakāśartham sattvam significa competente para iluminar.
Rajas está adaptado para ativar. Tamas é adaptado para restringir e competente para ser fixado em objetos inertes. Ou seja, os Guṇas são da natureza da iluminação, atividade e fixação. Mais uma vez, eles mutuamente suprimem, apoiam, produzem, cooperam e existem. Ou seja, eles são mutuamente repressivos, mutuamente sustentáveis, mutuamente produtivos, mutuamente consorciados e mutuamente existentes. Eles se suprimem mutuamente e se manifestam com as características de prazer, dor, etc. Isso significa que, quando sattva é predominante, então é assim, suprimindo rajas e tamas com suas características, exibindo-se assim como prazer e iluminação. Rajas predomina suprimindo sattva e tamas com suas características de dor e atividade. Quando a tamas predomina, suprime sattva e rajas com suas características de ilusão e fixação. Ainda, os Guṇas são mutuamente compatíveis como um (sistema) binário. Eles são mutuamente produtivos, como um pedaço de barro produz um jarro, e eles estão se consorciando mutuamente, como com marido e mulher. Eles são os companheiros de ajuda um do outro.
Eles existem e coexistem mutuamente. De acordo com o Bhagavad Gītā, “Os Guṇas existem nos Guṇas”. Assim como uma mulher bonita e virtuosa é uma fonte de prazer para alguns; mas a mesma mulher é uma fonte de dor para suas outras esposas; e a mesma mulher produz ilusão no apaixonado; similarmente, sattva é a fonte da existência de rajas e tamas. Assim como um rei justo, sempre assíduo em proteger seus súditos e punir os ímpios, produz prazer no bem, dor e ilusão nos iníquos; Da mesma forma, rajas traz a existência de sattva e tamas. Da mesma forma, tamas traz a existência de sattva e rajas pela sua própria natureza de cobrir as coisas. Por exemplo, as nuvens que cobrem o céu produzem prazer no mundo, proporcionando sombra; eles incitam o fazendeiro a atividade por sua chuva; e produzir ilusão nos amantes separados. Assim, os Guṇas são mutuamente existentes. Além disso:
13- सत्त्वं लघु प्रकाशकमिष्टमुपष्टम्भकं चलं च रजः । गुरु वरणकमेव तमः प्रदीपवच्चार्थतो वृत्तिः ॥ १३॥
sattvaṃ laghu prakāśakamiṣṭamupaṣṭambhakaṃ calaṃ ca rajaḥ । guru varaṇakameva tamaḥ pradīpavaccārthato vṛttiḥ ॥ 13॥
सत्त्व इष्ट लघु प्रकाश [sattva iṣṭa laghu prakāśa] sattva é considerado leve e brilhante* रजस् उपष्टम्भक चल [rajas upaṣṭambhaka cala] rajas, excitante e móvel* च तमस् एव गुरु वरणक [ca tamas eva guru varaṇaka] e tamas pesado e obstruinte* च प्रदीपवत् वृत्ति अर्थतस् [ca pradīpavat vṛtti arthatas] funcionam como uma lâmpada cujo propósito (é iluminar)*
13- Sattva é considerado leve e brilhante, Rajas excitante e móvel, e Tamas é pesado e obstruinte. Funcionam como uma lâmpada (composta de óleo, fogo e pavio), cujo propósito é iluminar.
Gauḍapāda: Sattva é leve e brilhante. Quando a sattva predomina, os membros tornam-se leves, o intelecto se torna brilhante e os órgãos se tornam claros. Rajas é excitante e móvel. Assim como um touro está muito excitado com a visão de outro touro, o mesmo acontece com a natureza de rajas. E rajas é visto como mobilidade. Um homem da natureza rajas é inconstante. Tamas é pesado e obstruinte. Quando a tamas predomina, os membros ficam pesados e os órgãos ficam retraídos; incapazes de apreender seus objetos. Aqui, pode-se perguntar como os guṇas mutuamente opostos produzem um efeito comum enquanto agem de acordo com suas próprias disposições. Como uma lâmpada, sua função é obter um fim. Sua função é considerada atingir um objetivo comum. Assim como uma lâmpada composta de óleo, fogo e pavio, que são opostos um ao outro, trabalham juntos para iluminar objetos, assim sattva, rajas e tamas, embora opostos um ao outro, produzem um efeito.
14- अविवेक्यादि हि सिद्धं त्रैगुण्यात् तद्विपर्ययाभावात् । कारणगुणात्मकत्वात् कार्यस्याव्यक्तमपि सिद्धम् ॥ १४॥
avivekyādi hi siddhaṃ traiguṇyāt tadviparyayābhāvāt । kāraṇaguṇātmakatvāt kāryasyāvyaktamapi siddham ॥ 14॥
अविवेक आदि सिद्धि [aviveka ādi siddhi] ausência de discriminação e outros está provado* त्रिगुण [triguṇa] a partir de sua constituição de três guṇas* तत् अभाव विपर्यय [tat viparyaya abhāva] (e pela) ausência de seu reverso* अव्यक्त अपि सिद्ध [avyakta api siddha] o não manifesto também está provado* कारण गुण आत्मकत्वात् कार्य [kāraṇa guṇa ātmakatvāt kārya] pelo fato do efeito ser da mesma natureza que sua causa*
14- A ausência de discriminação e o resto das características do manifesto são provadas no manifesto pela posse dos três guṇas e pela ausência de seu reverso. O não manifesto também é provado pelo fato do efeito ser da mesma natureza que sua causa.
Gauḍapāda: Outra questão surge depois de explicar que a natureza (pradhāna) e o manifesto são compostos dos três guṇas, não discriminados e objetivos. Como você sabe que a natureza (pradhāna) e o mahat manifestado e o resto são compostos dos três guṇas e do resto?
As características da não discriminação e o resto existem no mahat e no resto porque elas são da natureza dos três guṇas, mas as características não são provadas no não manifesto. Portanto, afirma-se que sabemos pela ausência de seu reverso. O reverso, a ausência disso, prova o manifesto. Assim, existe uma relação estabelecida entre o manifesto e o não manifesto. Longe está o não manifesto, mas o manifesto está próximo. Então, aquele que vê o manifesto também vê o não manifesto porque existe a ausência de seu reverso.
Daí também o não manifesto é provado por causa de um efeito sendo da mesma natureza que a sua causa. Nós vemos neste mundo que seja qual for a essência de uma causa, o mesmo está no efeito. De fio preto, apenas tecido preto é produzido. Assim, a fusão mahat e o resto são, não discriminados, objetivos, gerais, não inteligentes e produtivos. Assim, seja qual for a essência da fusão, o não manifesto também provou possuir a mesma essência.
Por causa da posse dos três guṇas, a não discriminação e o resto são provados existir no manifesto; pela ausência do reverso e pelo efeito da mesma natureza de sua causa, o não manifesto também é provado. Pode-se dizer que isso é falso porque tudo o que não apreendemos neste mundo não existe. A isso respondemos que não se pode apreender o cheiro em uma pedra, mas isso não significa que não esteja lá. Da mesma forma, a natureza também existe, mas não é apreendida.
15- भेदानां परिमाणात् समन्वयाच्छक्तितः प्रवृत्तेश्च । कारणकार्यविभागादविभागाद् वैश्वरूपस्य १५॥
bhedānāṃ parimāṇāt samanvayācchaktitaḥ pravṛtteśca । kāraṇakāryavibhāgādavibhāgād vaiśvarūpasya 15॥
भेदान परिमाण [bhedāna parimāṇa] finitude de objetos específicos* समन्वय [samanvaya] semelhança na diversidade* शक्तितस् प्रवृत्ति [śaktitas pravṛtti] atividade dependendo da potencialidade da causa* कारण कार्य विभाग [kāraṇa kārya vibhāga] distinção entre causa e efeito* च [ca] e* वैश्वरूप अविभाग [vaiśvarūpa avibhāga] fusão dessa diversidade evoluída*
15- A causa Imanifesta existe devido à: (1) Finitude de objetos específicos (bhedāna parimāṇa); (2) Semelhança na diversidade (samanvaya); 3) Atividade dependendo da potencialidade da causa (śaktitas pravṛtti), (4) Distinção entre causa e efeito (kāraṇakārya vibhāga); e (5) Fusão dessa diversidade evoluída em avyakta, prakṛti (vaiśvarūpa avibhāga).
Gauḍapāda: A causa não manifesta existe. Essa ideia é transmitida pela relação de sujeito e predicado na sentença - primeiro, o não manifesto é declarado, e então o não manifesto é estabelecido por causa da finitude de objetos específicos. Neste mundo, onde quer que encontremos um agente, vemos a finitude de seus objetos. Por exemplo, um oleiro faz apenas vasos finitos a partir de pedaços finitos de argila; o mesmo acontece com mahat. A fusão mahat e o resto são finitos e são os efeitos específicos da natureza. O intelecto é um; o ego é um; os elementos sutis são cinco; os órgãos são onze; e os elementos brutos são cinco. Assim, por causa da finitude dos objetos específicos, há a Natureza como a causa que produz o manifesto finito. Se não houvesse a natureza, então até este manifesto seria infinito. E assim, por conta da finitude dos objetos específicos, há a Natureza de onde surgiu este manifesto.
Em seguida é a sequência natural. É bem aceito neste mundo que, quando vemos um menino empenhado em realizar ritos sagrados, podemos naturalmente inferir que seus pais são brâmanes. Da mesma forma, vendo essa fusão, chegamos a uma coisa que deve ser sua causa. Assim, por sequência natural, há a natureza.
Também a atividade depende da eficiência. Contratamos um operário para a tarefa para a qual ele é eficiente. Por exemplo, um oleiro que é eficiente para produzir uma jarra produz um jarro, não um pano ou uma carruagem.
Novamente, há a natureza como causa por causa da distinção entre causa e efeito. Kārana é aquilo que produz; karya é aquilo que é produzido. Há uma distinção de funções entre causa e efeito. Usando o mesmo exemplo acima, um frasco é competente para conter coalhada, mel, água e leite, e um pedaço de argila não é competente para fazê-lo. E um pedaço de barro produz um jarro, mas um jarro não produz um pedaço de barro. Assim, vendo a fusão mahat e o resto, infere-se que há uma causa separada da qual este manifesto evoluiu.
E, novamente, por causa da fusão da diversidade (o evoluído), sabemos da existência de uma causa não manifesta. Viśva significa universo. Sua rūpa, forma, é manifestação. Por causa da fusão da abstração de viśvarūpa, todas as formas manifestas ou evoluídas, a Natureza deve existir porque não há distinção mútua entre os três mundos e os cinco elementos grosseiros. Os três mundos estão incluídos nos cinco elementos brutos. No momento da dissolução, os cinco elementos grosseiros da terra, da água, do fogo, do ar e do éter fundem-se nos elementos sutis modificados na ordem da projeção: os cinco elementos sutis e os onze órgãos se fundem no ego; o ego se funde no intelecto; o intelecto se funde na natureza. Assim, os três mundos se fundem na natureza no momento da dissolução. De tal fusão do manifesto e do não manifesto, como o leite e a coalhada, entendemos que o não manifesto existe como causa. E por esse motivo:
16- कारणमस्त्यव्यक्तं प्रवर्तते त्रिगुणतः समुदयाच्च । परिणामतः सलिलवत् प्रतिप्रतिगुणाश्रयविशेषात् ॥ १६॥
kāraṇamastyavyaktaṃ pravartate triguṇataḥ samudayācca । pariṇāmataḥ salilavat pratipratiguṇāśrayaviśeṣāt ॥ 16॥
अव्यक्त अस्ति कारण [avyakta asti kāraṇa] o não manifesto existe como causa* प्रवर्तते त्रिगुण [pravartate triguṇa] (ele) opera (através dos) três guṇas* च [ca] e* परिणाम समुदय सलिलवत् [pariṇāma samudaya salilavat] por modificação por combinação como água* प्रतिप्रति गुण आश्रय विशेष [pratiprati guṇa āśraya viśeṣa] pois objetos diferentes são diversificados pelos guṇas*
16- O não manifesto existe como causa. Ele opera por meio dos três guṇas, e por combinação, por modificação, como água; pois objetos diferentes são diversificados pelos guṇas.
Gauḍapāda: O conhecido não manifesto existe como a causa, do qual procede o fusível mahat e o resto. Triguna indica a natureza possuir os três guṇas de sattva, rajas e tamas. Então, qual é a sensação de que a natureza é o equilíbrio de sattva, rajas e tamas?
É através da combinação que muitos córregos produzem um rio; da mesma forma, o não manifesto dotado dos três guṇas produz um manifesto. Ou, como os fios combinados produzem tecido, o não manifesto cria o mahat e o resto por causa da combinação dos três guṇas. Assim, o universo manifesto procede dos três guṇas e sua combinação.
Como todo o manifesto procede da natureza, podemos concluir que a primeira deve ser uniforme. Como assim? Os três mundos nascidos da natureza não são de natureza uniforme. Os devas são felizes; os homens são infelizes; e os animais estão iludidos. O manifesto, procedente de um não manifesto, torna-se como água por causa de modificações baseadas na característica particular que permanece em cada um dos três guṇas. A repetição de prati denota sucessão. Guṇāśrayaa significa a morada dos guṇas - cada característica particular.
Por exemplo, a água caindo do céu é de natureza uniforme, mas entrando em contato com diferentes plantas ou moradas para a água, a água desenvolve diferentes sabores em nossas bocas. Da mesma forma, os três mundos provenientes da natureza não são de natureza uniforme. Entre os devas, sattva é predominante e rajas e tamas são indiferentes, então eles são felizes. Entre os homens, rajas é predominante e sattva e tamas são indiferentes, portanto, são infelizes. Entre os animais, tamas é predominante e sattva e rajas são indiferentes, por isso são insensíveis.
17- सङ्घातपरार्थत्वात् त्रिगुणादिविपर्ययादधिष्ठानात् । पुरुषोऽस्ति भोक्तृभावात् कैवल्यार्थं१ प्रवृत्तेश्च ॥ १७॥
saṅghātaparārthatvāt triguṇādiviparyayādadhiṣṭhānāt । puruṣo'sti bhoktṛbhāvāt kaivalyārthaṃ1 pravṛtteśca ॥ 17॥
पुरुष अस्ति [puruṣa asti] o puruṣa deve existir porque* सङ्घात पर अर्थत्वात् [saṅghāta para arthatvāt] o conjunto de objetos sensíveis deve servir para um propósito* त्रिगुण आदि विपर्यय [triguṇa ādi viparyaya] não sofre a ação dos três guṇas* अधिष्ठान [adhiṣṭhāna] deve existir um administrador* भोक्तृ भाव [bhoktṛ bhāva] deve haver um usufruidor* च [ca] e* कैवल्य अर्थ प्रवृत्ति [kaivalya artha pravṛtti] há desejo de liberação*
17- O Puruṣa existe porque: 1- O conjunto de objetos sensíveis deve servir para algum propósito (Saṅghāta Parārthatvāt); 2- Não sofre a ação dos três guṇas (Triguṇādiviparyayād); 3- Deve existir um administrador (Adhiṣṭhānāt); 4- Deve haver um usufruidor (Bhoktṛbhāvāt), e 5- Há o desejo de liberação (Kaivalyārtham Pravṛtteśca).
Gauḍapāda: Agora, o autor passa a provar a existência do Puruṣa. Foi assegurado que a liberação é obtida pelo conhecimento discriminativo do manifesto, do não manifesto e do Conhecedor. Primeiro, o conhecimento da existência do manifesto e do não manifesto foi dado. Assim como a naturreza não manifestada, o Puruṣa é sutil. Sua existência é provada por inferência. A sugestão é que o Puruṣa existe, pois os objetos compostos são destinados a outro. Infere-se que a composição de mahat e o resto é destinada ao Puruṣa porque a composição é inconsciente como uma cama. Ié. uma cama é composta de uma armação e colchão, um pano de algodão e um travesseiro. Ela serve ao propósito de outra pessoa e não a ela própria. As diferentes partes da cama não podem servir a nenhum propósito mútuo. Infere-se que há uma pessoa que dorme na cama para quem a cama é destinada. Então, este corpo, um composto dos cinco elementos grosseiros, é destinado a outro. Existe o Puruṣa para quem este corpo agradável, que é um composto de mahat e o resto, nasce.
Daí também existe o Puruṣa, pois é o inverso daquilo que tem os três atributos; é não discriminado, objetivo e o resto mencionado no verso anterior, porque foi dito que o Puruṣa é similar e diferente.
Além disso, a prova da existência do Puruṣa é encontrada na observação de que deve haver controle. Como uma carruagem unida a cavalos capazes de saltar, galopar e correr, por causa do controle de um cocheiro, o corpo também funciona devido ao controle do Puruṣa. Como é dito no Sastitantra, “a natureza funciona quando controlada pelo Puruṣa”.
Além disso, o Puruṣa existe, pois deve haver alguém que desfruta. Inferimos que deve haver um apreciador de vários alimentos aromatizados com os seis sabores de doce, azedo, salgado, pungente, amargo e adstringente. Da mesma forma, porque a fusão e o resto não são desfrutadores, inferimos que o Puruṣa existe para o desfrute deste corpo.
Podemos também inferir que o Puruṣa existe desde que haja atividade para a liberação. Kaivalya é a abstração do significado de kevala sozinho. A atividade para alcançar este propósito é para liberação do Puruṣa. E assim infere-se que o Puruṣa existe. Todos, letrados e não, anseiam pela cessação do sofrimento e o fim do ciclo de nascimento e morte. Por estas razões, existe o Puruṣa separado do corpo.
18-जननमरणकरणानां प्रतिनियमादयुगपत् प्रवृत्तेश्च । पुरुषबहुत्वं सिद्धं त्रैगुण्यविपर्ययाच्चैव ॥ १८॥
jananamaraṇakaraṇānāṃ pratiniyamādayugapat pravṛtteśca । puruṣabahutvaṃ siddhaṃ traiguṇyaviparyayāccaiva ॥ 18॥
पुरुष बहुत्व सिद्धि [puruṣa bahutva siddhi] a pluralidade de puruṣas é fundamentada* जनन मरण करण [janana maraṇa karaṇa] (porque) nascimento, morte e os órgãos de ação e percepção* प्रतिनियम [pratiniyama] são distribuídos separadamente* च [ca] e* अयुगपद् प्रवृत्ति [ayugapad pravṛtti] pela não simultaneidade das atividades* च एव विपर्यय त्रिगुण [ca eva viparyaya triguṇa] também porque existem diversas modificações devido aos três guṇas*
18- A profusão dos Puruṣas é fundamentada porque: nascimento, morte e os órgãos de ação e percepção são distribuídos separadamente, pela não simultaneidade das atividades, também, porque existem diversas modificações devido aos três guṇas.
Gauḍapāda: O Puruṣa é único - controlando todos os corpos como uma corda passando por uma corrente de pérolas - ou há muitos Puruṣas controlando cada corpo? Janma marana karana significa nascimento, morte e os órgãos. Se houvesse um único Puruṣa, então quando alguém nascesse, todos nasceriam; ou quando alguém morresse, todos morreriam; do mesmo modo, se alguém tivesse algum defeito orgânico na forma de surdez, cegueira, mudez, mutilação ou claudicação, então todos seriam surdos, cegos, mutilados ou coxos. Mas isso não acontece assim. Portanto, como o nascimento, a morte e os órgãos são distribuídos separadamente, assim, a pluralidade dos Puruṣas é estabelecida.
Não há dominância de uma atividade, por todos, ao mesmo tempo. Todas as pessoas não estão envolvidas em virtude, todas ao mesmo tempo. Alguns estão envolvidos em virtude, outros em vício; alguns em renúncia e alguns em conhecimento. Portanto, por não haver dominância de uma atividade ao mesmo tempo, é prova de que há muitos Puruṣas.
Além disso, como existem diferentes modificações dos três atributos, a pluralidade dos Puruṣas é provada. Por exemplo, na vida cotidiana, uma pessoa sāttvika é feliz, uma pessoa rājasica é infeliz e uma pessoa tāmasica vive iludida. Assim, pelas várias incompatibilidades, a pluralidade dos Puruṣas é estabelecida.
Sāṃkhya kārikā de Iśvarakṛṣṇa com comentários de Gaudapādā / [19 - 36]
19- तस्माच्च विपर्यासात् सिद्धं साक्षित्वमस्य पुरुषस्य । कैवल्यं माध्यस्थ्यं द्रष्टृत्वमकर्तृभावश्च ॥ १९॥
tasmācca viparyāsāt siddhaṃ sākṣitvamasya puruṣasya । kaivalyaṃ mādhyasthyaṃ draṣṭṛtvamakartṛbhāvaśca ॥ 19॥
च तस्मात् विपर्यास [ca tasmāt viparyāsa] desse contraste* अस्य पुरुष साक्षित्व सिद्धि [asya puruṣa sākṣitva siddhi] é estabelecido que o puruṣa é testemunha* कैवल्य [kaivalya] é solitário* माध्यस्त्य [mādhyastya] é indiferente* द्रष्टृत्व [draṣṭṛtva] é perceptivo* च भाव अकर्तृ [ca bhāva akartṛ] e é um não agente (inativo)*
19- E a partir desse contraste é estabelecido que o Puruṣa é testemunha, solitário, indiferente, perceptivo e inativo.
Gauḍapāda: E a partir desse contraste, (fica estabelecido que) o Puruṣa é desprovido de atributos, é discriminativo, e é o desfrutador. O contraste está nas qualidades do Puruṣa. Portanto, porque sattva, rajas e tamas são agentes ativos, segue-se que o Puruṣa é dotado das características de testemunhar aquilo que ocorre no manifesto. Apenas os atributos, dos que são agentes, são ativos, e o Puruṣa é indiferente.
Além disso, o Puruṣa mantem-se isolado (Kaivalya) daquele que é possuidor dos três atributos. O Puruṣa permanece inativo enquanto os três atributos estão ativos.
Uma objeção a essa prova é que se o Puruṣa é um não agente, então como ele exerce a volição de praticar a virtude em vez de vício? Nesse caso, deve ser um agente.
20- तस्मात् तत्संयोगादचेतनं चेतनावदिव लिङ्गम् । गुणकर्तृत्वे च तथा कर्तेव भवत्युदासीनः ॥ २०॥
tasmāt tatsaṃyogādacetanaṃ cetanāvadiva liṅgam । guṇakartṛtve ca tathā karteva bhavatyudāsīnaḥ ॥ 20॥
तस्मात् तत् संयोग [tasmāt tat saṃyoga] portanto da conjunção (com o puruṣa)* अचेतन लिङ्ग [acetana liṅga] o não consciente liṅga (buddhi e os outros)* चेतनावत् इव [cetanāvat iva] (comporta-se) como consciente* तथा गुणकर्तृत्व अपि [tathā guṇakartṛtva api] embora a atividade seja apenas uma função dos guṇas* उदासीन भवति इव कर्त [udāsīna bhavati iva karta] o inativo puruṣa parece ser o agente*
20- Portanto da conjunção (com o puruṣa) o não consciente liṅga (buddhi e os outros) comporta-se como consciente, embora a atividade seja apenas uma função dos Guṇas, o inativo Puruṣa parece ser o agente.
Gauḍapāda: Aqui, a consciência pertence ao Puruṣa. Portanto, o linga (o mahat e o resto), entrando em contato com o reflexo do Puruṣa consciente, tornam-se como se fossem conscientes. Quando um pote fica frio quando entra em contato com o frescor e fica quente quando em contato com o calor, o linga, o mahat e o resto, ao entrar em contato com esse Puruṣa, tornam-se como se fossem conscientes. Portanto, a volição é exercida pelos atributos e não pelo Puruṣa.
A atividade pertence aos atributos, mas o Puruṣa indiferente parece ser um agente. Dizemos que um homem age e anda, mas o Puruṣa interior não está agindo ou andando. A atividade reside nos atributos, e o Puruṣa indiferente se torna como um agente, embora não seja um agente real. Há uma ilustração disso com uma pessoa que é presa junto com ladrões e é considerada uma ladra quando na verdade não é um ladrão. Os agentes reais são os atributos, e o Puruṣa, embora indiferente, entra em contato com os atributos e aparece ativo. Assim, a distinção do manifesto, do não manifesto e do Puruṣa foi explicada. E com discernimento entre esses três, a liberação é obtida.
21- पुरुषस्य दर्शनार्थं कैवल्यार्थं तथा प्रधानस्य । पङ्ग्वन्धवदुभयोरपि संयोगस्तत्कृतः सर्गः ॥ २१॥
puruṣasya darśanārthaṃ kaivalyārthaṃ tathā pradhānasya । paṅgvandhavadubhayorapi saṃyogastatkṛtaḥ sargaḥ ॥ 21॥
संयोग प्रधान पुरुष [saṃyoga pradhāna puruṣa] a união do pradhāna (natureza primordial) com o puruṣa* उभय अपि दर्शन अर्थ [ubhaya api darśana artha] serve a um duplo propósito contemplação (da natureza primordial pelo puruṣa)* तथा कैवल्य अर्थं [tathā kaivalya arthaṃ] e a consequente obtenção de kaivalya* पङ्गु अन्धवत् [paṅgu andhavat] é como a associação de um cego com um coxo* तत् कृत सर्ग [tat kṛta sarga] desta união procede a criação*
21- A união (saṃyoga) do Pradhāna (natureza primordial) com o Puruṣa serve a um duplo propósito: a contemplação do Pradhāna pelo Puruṣa e a consequente obtenção de kaivalya (liberação) pelo Puruṣa; é como a associação de um cego com um coxo. Desta união procede a criação.
Gauḍapāda: A união do Puruṣa com o Pradhāna (Prakṛti) é para contemplação. O Puruṣa contempla a Prakṛti e seus efeitos, começando do mahat e terminando com os elementos grosseiros. Por essa razão, a união da Prakṛti com o Puruṣa é para a liberação.
Essa união de ambos deve ser considerada como a de um homem coxo com um homem cego. Por exemplo, um homem é manco e o outro cego. Esses dois homens estão viajando com dificuldade em uma caravana. Quando a caravana é atacada por ladrões na floresta, estes dois são abandonados por seus amigos e vagam a esmo. No curso de sua errância, eles se encontram e decidem ajudar-se mutuamente. Reunindo e confiando nas habilidades de cada um, eles podem prosseguir. O cego coloca o homem coxo em seus ombros e a visão do homem coxo os guia pela estrada. O Puruṣa, como o homem coxo, tem o poder da contemplação, mas não da ação. A Prakṛti , como o cego, tem o poder da ação, mas não a contemplação. E assim como haverá separação entre o cego e o coxo depois que o destino mútuo for alcançado, a Prakṛti deixa de agir depois de provocar a liberação do Puruṣa, e o Puruṣa se isola depois de contemplar a Prakṛti. Depois que seu objetivo mútuo é alcançado, a separação virá.
Além disso, a criação é provocada por essa aliança. Assim como uma criança é concebida a partir da união do homem e da mulher, da mesma forma, a criação é provocada pelo Puruṣa que anima a Prakṛti.
22- प्रकृतेर्महांस्ततोऽहङ्कारस्तस्माद् गणश्च षोडशकः । तस्मादपि षोडशकात् पञ्चभ्यः पञ्च भूतानि ॥ २२॥
prakṛtermahāṃstato'haṅkārastasmād gaṇaśca ṣoḍaśakaḥ । tasmādapi ṣoḍaśakāt pañcabhyaḥ pañca bhūtāni ॥ 22॥
प्रकृति [prakṛti] de prakṛti* महात् [mahat] mahat (buddhi)* ततस् [tatas] daí* अहंकार [ahaṃkāra] procede ahamkāra (ego)* तस्मात् च [tasmāt ca] daí* गण षोडशक [gaṇa ṣoḍaśaka] o grupo dos dezesseis (onze órgãos dos sentidos, incluindo manas e os cinco tanmatras)* तस्मात् अपि पञ्चभ्यः षोडशक [tasmāt api pañcabhyaḥ ṣoḍaśaka] e dos cinco deste conjunto de dezesseis* पञ्च भूत [pañca bhūta] (surgem) os cinco elementos densos*
22- Da Prakṛti procede Mahat (buddhi), daí Ahaṁkāra (ego) e daí o grupo dos dezesseis (onze órgãos dos sentidos, incluindo manas) e os cinco Tanmatras (elementos sutís); e dos cinco (tanmatras), deste conjunto de dezesseis, surgem os cinco elementos densos (pañcabhūta).
Gauḍapāda: Agora, começa a explicação de todos os produtos. Prakṛti (natureza primordial), pradhāna, brahman, avyakta, bahudhātmaka e māyā são sinônimos em todas as escrituras. Da Prakṛti, desprovida de características, nasce o intelecto. O intelecto é chamado mahat (buddhi, āsurī, mati, khyāti, jñāna e prajñā como sinônimos).
De mahat, nasce ahaṃkāra, o ego (bhūtādi, vaikrta, taijasa e abhimāna são sinônimos para o ego). De Ahamkāra, o grupo dos dezesseis é produzido: os cinco elementos sutis, som, tato, visão, paladar e olfato, e os onze órgãos, os cinco órgãos dos sentidos, cinco órgãos de ação, incluindo a mente. Os cinco órgãos dos sentidos são ouvido, pele, olhos, língua e nariz. Os cinco órgãos de ação são a língua, as mãos, os pés, os órgãos de procriação e o ânus. O décimo primeiro órgão, a mente, tem as características de ambos os órgãos dos sentidos e de ação. Este grupo de dezesseis é produzido a partir do ego. E, dos cinco elementos sutis, nascem os cinco elementos densos: Espaço do elemento som; vento do tato; fogo da luz; água do sabor; e terra do cheiro. Assim, dos cinco elementos sutis nascem os cinco elementos densos.
A liberação resulta do conhecimento discriminativo do manifesto, do não manifesto e do Conhecedor. Neste contexto, os vinte e três aspectos da Prakṛti manifesta foram descritos, começando com mahat e terminando com os elementos densos. O não manifesto foi explicado como a causa da “finitude dos objetos específicos” (15). O Puruṣa também foi explicado pelas razões mencionadas no verso 17: "os objetos compostos são destinados para o outro". Esses são os vinte e cinco princípios. Um princípio é um tattva - a abstração do existente. Uma pessoa que conhece todos os três mundos permeados por esses torna-se liberada. Como foi dito, uma pessoa que conhece os vinte e cinco tattvas (princípios), torna-se liberada, não importa em que fase da vida, jovem ou velho, seja cabeludo ou careca, quem conhece esses princípios será livre. Não há dúvidas sobre isso.
Os princípios são Prakṛti, Puruṣa, buddhi, ahaṃkāra, os cinco elementos sutis, os onze órgãos e os cinco elementos brutos. Foi dito que o intelecto nasce da Prakṛti. Qual é a natureza desse intelecto? Será descrito.
23- अध्यवसायो बुद्धिर्धर्मो ज्ञानं विरागाइश्वर्यम् । सात्त्विकमेतद्रूपं तामसमस्माद् विपर्यस्तम् ॥ २३॥
adhyavasāyo buddhirdharmo jñānaṃ virāgāiśvaryam । sāttvikametadrūpaṃ tāmasamasmād viparyastam ॥ 23॥
बुद्धि [buddhi] buddhi (intelecto)* अध्यवसाय [adhyavasāya] é a capacidade cognitiva* धर्म [dharma] virtude* ज्ञान [jñāna] conhecimento* विराग [virāga] desapego* ऐश्वर्य [aiśvarya] e poder* सात्त्विकम् [sāttvikam] em sua sua forma sāttvika* एतद् रूप तामसम् [etad rūpa tāmasam] na forma tāmasica* विपर्यस्त अस्मात् [viparyasta asmāt] (ocorre o) o oposto*
23- Buddhi (intelecto) é a capacidade cognitiva (adhyavasāya). virtude, conhecimento, desapego e poder em sua forma sāttvika. Na forma tāmasica ocorre o oposto.
Gauḍapāda: Faculdade da percepção mental é uma definição de intelecto. Adhyavasāya significa averiguação e está presente no intelecto como a germinação futura de um broto em uma semente. Isto é, é a cognição precisa que surge quando se determina que isto é um jarro, isto é pano.
Esse intelecto tem oito partes em relação aos tattvas sāttva ou tāmas. A forma sāttvika do intelecto é de quatro tipos: virtude, conhecimento, não-apego e poder.
A virtude é da natureza da misericórdia, da caridade, dos cinco yamas (restrições) e dos cinco niyamas (obrigações). Os yamas e niyamas são descritos no tratado de Patañjali. Pacifismo, veracidade, honestidade, continência e desapego são os yamas. Pureza, serenidade, austeridade, estudo das escrituras e devoção a Deus são os niyamas.
Luz (prakāśa), compreensão (avagama) e manifestação (bhāna) são sinônimos de conhecimento. O conhecimento externo é composto pela escrituras, juntamente com os seis ramos dos vedangas (śikṣā: fonética e fonologia (sandhi); chandas: métrica; vyākaraṇa: gramática; nirukta: etimologia; jyotiṣa: astrologia e astronomia; kalpa: ritual.), dos Puranas, do Nyāya, do Mīmāmsā e dos Dharmaśastras. O conhecimento interno é o conhecimento discriminativo da Prakṛti e do Puruṣa. Esta Prakṛti é o equilíbrio de sattva, rajas e tamas. O Puruṣa é o realizado, livre dos atributos, permeável e inteligente. O resultado do conhecimento externo é celebridade e admiração entre as pessoas. O resultado do conhecimento interno é a liberação.
O desapego também é de dois tipos: externo e interno. O não-apego externo é a liberdade do apego em relação aos objetos dos sentidos. O não-apego interno surge na mente da pessoa que deseja a liberação, observando gradualmente que até a Prakṛti é como maya (mágica ou um sonho).
Poder é competência. É de oito tipos: animā, mahimā, garimā, laghimā, prāpti, prākāmya, īśitva e vaśitva. Animā minimização. Mahimā é o oposto, o poder de adquirir uma forma grande. Laghimā é a capacidade de se tornar leve como uma pena, e garimā é o oposto, tornando-se pesado. Prāpti permite que uma pessoa obtenha qualquer objeto desejado. O Prākāmya fornece o poder de fazer o que quiser. Īśitva é o poder divino de reinar sobre os três mundos. E, Vaśitva é o poder de trazer qualquer coisa sob o controle de alguém.
Virtude, conhecimento, não-apego e poder são as formas sāttvika do intelecto. Quando sattva supera rajas e tamas, a pessoa adquire essas qualidades intelectuais. E além disso, a forma de tāmasica é o reverso disso. O reverso da virtude é o vício. Da mesma forma, a ignorância, o apego e a ausência de poderes são o reverso do conhecimento, do desapego e dos poderes divinos. O intelecto, tendo oito formas de acordo com sua qualidade sāttvika ou tāmasica, evolui do não-manifesto possuidor dos três atributos.
24- अभिमानोऽहङ्कारस्तस्माद् द्विविधः प्रवर्तते सर्गः । एकादशकश्च गणस्तन्मात्रः पञ्चकश्चैव ॥ २४॥
abhimāno'haṅkārastasmād dvividhaḥ pravartate sargaḥ । ekādaśakaśca gaṇastanmātraḥ pañcakaścaiva ॥ 24॥
अहंकार अभिमान [ahaṃkāra abhimāna] ahaṃkāra é auto conceito (princípio de individuação)* तस्मात् प्रवर्तते द्विध सर्ग [tasmāt pravartate dvidha sarga] dele procedem os dois tipos de criação* च [ca] e* एकादश गण [ekādaśa gaṇa] os onze agregados (órgãos dos sentidos e ação, e a mente)* च एव [ca eva] e também* पञ्चक तन्मात्र [pañcaka tanmātra] e os cinco tanmātras (elementos sutis)*
24- Ahaṃkāra (ego) é o auto conceito; Dele procedem os dois tipos de criação - o grupo dos onze (órgãos dos sentidos e a mente) e os cinco elementos sutis (tanmātras).
Gauḍapāda: No conjunto de onze partes: os onze órgãos. Os cinco elementos sutís: matéria elementar de cinco tipos, ou os rudimentares (tanmātras), som, tato, forma, sabor e odor. Que tipo de criação procede daquilo que é assim definido: (Isso) é explicado a seguir.
25- सात्त्विकैकादशकः प्रवर्तते वैकृतादहङ्कारात् । भूतादेस्तन्मात्रः स तामसस्तैजसादुभयम् ॥ २५॥
sāttvikaikādaśakaḥ pravartate vaikṛtādahaṅkārāt । bhūtādestanmātraḥ sa tāmasastaijasādubhayam ॥ 25॥
वैकृत अहंकार [vaikṛta ahaṃkāra] da forma vaikṛta do ahamkāra* प्रवर्तते एकादशक सात्त्विक [pravartate ekādaśaka sāttvika] procede o grupo sattviko dos onze* भूतदि तन्मात्र तामस [bhūtadi tanmātra tāmasa] da forma bhūtādi procede o grupo tāmasico dos tanmātras* तैजस उभय [taijasa ubhaya] da forma taijasa procedem ambos*
25- Da forma vaikrta do ahaṃkāra procede o grupo sattviko dos onze. Da forma bhūtādi procede o grupo tāmasico dos tanmātras. Da forma taijasa procedem ambos.
Gauḍapāda: Quando sattva predomina sobre tamas e rajas, ahaṃkāra é sattvico; cujo nome, segundo os antigos mestres, era vaikrta, "o modificado". Deste ego modificado é produzida o grupo dos onze órgãos.
Quando tamas predomina no ahaṃkāra sobre sattva e rajas, esse ahaṃkāra é chamado tamásico. Foi chamado pelos antigos mestres, de "elemento primitivo" bhūtādi. Daí vêm os cinco elementos sutis, tanmātras. Esse grupo é chamado tamasico: a partir desse grupo dos cinco procedem os elementos densos. Quando rajas predomina sobre sattva e tamas, ahaṃkāra recebe a denominação taijasa, "o ativo" e dele ambos procedem; os onze órgãos e os cinco tanmātras.
Para o ahaṃkāra sattvico (que é o vaikrta, 'o modificado') produzir os onze órgãos é necessário um ahaṃkāra ativo como assistente; pois o ahaṃkāra puro (sattvico) é inerte, e só é capaz de produzir os órgãos quando combinado com o ativo. De maneira semelhante, o ahaṃkāra tamasico, ou aquilo "que é" chamado de "elemento primitivo", é inerte e torna-se ativo apenas em união com o ativo, quando produz os cinco tanmatras.
26- बुद्धीन्द्रियाणि चक्षुः श्रोत्रघ्राणरसनत्वगाख्यानि । वाक्पाणिपादपायूपस्थान् कर्मेन्द्रियान्याहुः ॥ २६॥
buddhīndriyāṇi cakṣuḥ śrotraghrāṇarasanatvagākhyāni । vākpāṇipādapāyūpasthān karmendriyānyāhuḥ ॥ 26॥
बुद्धि इन्द्रिय आख्यानि [buddhi indriya ākhyāni] os órgãos dos sentidos são conhecidos como* चक्षुस् स्रोत्र घ्राण रसन त्वक् [cakṣus srotra ghrāṇa rasana tvak] olhos, orelhas, nariz, língua e pele* वाक् पाणि पाद पायू उपस्ता [vāk pāṇi pāda pāyū upastā] o aparelho fonador, as mãos, os pés, o ânus e o órgão da procriação* आहुः कर्म इन्द्रियाणि [āhuḥ karma indriyāṇi] são chamados de órgãos de ação*
26- Os órgãos dos sentidos são conhecidos como: olhos, orelhas, nariz, língua e pele. O aparelho fonador, as mãos, os pés, o ânus e o órgão da procriação constituem os órgãos de ação.
Gauḍapāda: O grupo dos onze órgãos é sāttvico. Olhos, ouvidos, nariz, língua e pele são os órgãos dos sentidos; Eles são chamados os cinco órgãos do sentido porque apreendem os cinco objetos: som, toque, forma, gosto e cheiro. Aparelho fonador, mãos, pés, ânus e os órgãos de procriação são chamados de órgãos de ação; Eles são chamados assim porque executam ações. O aparelho fonador fala, as mãos agem, os pés andam, o ânus excreta e os órgãos de procriação proporcionam prazer e progênie.
27- उभयात्मकमत्र मनः सङ्कल्पकमिन्द्रियं च साधर्म्यात् । गुणपरिणामविशेषान् नानात्वं बाह्यभेदाच्च ॥ २७॥
ubhayātmakamatra manaḥ saṅkalpakamindriyaṃ ca sādharmyāt । guṇapariṇāmaviśeṣān nānātvaṃ bāhyabhedācca ॥ 27॥
अत्र मनस् उभयात्मकम् [atra manas ubhayātmakam] entre os órgãos dos sentidos a mente possui a natureza de ambos* संकल्पक [saṃkalpaka] é o princípio da reflexão* च इन्द्रिय [ca indriya] e é também órgão sensorial* साधर्म्य [sādharmya] por suas propriedades similares* नानात्व [nānātva] essa diversidade* बाह्य भेद च [bāhya bheda ca] e das coisas externas* परिणाम विशेष गुण [pariṇāma viśeṣa guṇa] surgem das modificações específicas dos atributos*
27- Entre os órgãos dos sentidos e de ação, a mente possui a natureza de ambos. É o princípio da reflexão, e é considerada um órgão sensorial, uma vez que possui propriedades análogas. Essa diversidade dos órgãos surgem das modificações específicas dos atributos.
Gauḍapāda: A mente tem a natureza dos órgãos dos sentidos e de ação porque determina a função desses órgãos. Entre os órgãos dos sentidos, é como um órgão de sentido; Entre os órgãos de ação, é como um órgão de ação. Portanto, a mente tem características de ambas porque é determinante em ambas.
Além disso, é um órgão devido à sua similaridade com os outros sentidos de cognição e ação. Os órgãos do sentido e da ação procedem com a mente do ahaṃkāra sāttvico, provocando a similaridade da mente. Por causa dessa semelhança, a mente também é um órgão. Assim, esses onze órgãos são produzidos a partir do ahaṃkāra sāttvico ou vaikrta. A função da mente é deliberação. As funções dos órgãos dos sentidos são a audição e o resto. E as funções dos órgãos de ação são a fala e o resto.
Agora, estes diferentes órgãos estão apreendendo diferentes objetos criados por Deus ou são auto-gerados? Porque Pradhāna, intelecto e o ahaṃkāra não são inteligentes e o Puruṣa é inativo aqui, entre os seguidores da doutrina Sāṃkhya existe a espontaneidade como causa. A este respeito, diz-se, a diversidade dos órgãos e as diversidades externas decorrem das modificações específicas dos atributos.
Esses onze órgãos funcionam com objetivos diferentes. Cada órgão dos sentidos coleta informações de seu objeto de sentido correspondente. Os cinco órgãos de ação funcionam como falar, agarrar, andar, excretar e dar prazer. E deliberação é a função da mente. Assim, essas diferentes características dos diferentes órgãos surgem das modificações específicas dos atributos. Da especificação surgem a diversidade dos órgãos e as diversidades externas. Essa diversidade não é causada por Deus, ahaṃkāra, intelecto, Pradhāna ou Puruṣa, mas é causada pela modificação espontânea dos atributos. Mas, pode haver alguma atividade entre os atributos, que não são inteligentes? Sim. “Assim como há atividade no leite não inteligente para o crescimento do bezerro da mesma forma, há uma atividade na natureza para trazer a libertação do Puruṣa.” (Kārikā 57)
Os atributos não inteligentes são modificados como os onze órgãos. As especificações também são causadas por esses atributos. Assim, o olho é colocado em um lugar mais alto no corpo para observação, e assim o nariz, o ouvido e a língua são colocados em seus devidos lugares no corpo para apreender seus objetos particulares. Da mesma forma, os órgãos de ação estão em seus devidos lugares para realizar suas ações necessárias relacionadas à apreensão dos objetos dos sentidos. Isso é resultado da modificação espontânea dos atributos e não dos objetos desses órgãos. Pois, diz-se que os atributos funcionam nos atributos. O funcionamento dos atributos tem os próprios atributos como seu próprio campo. Assim, as diversidades externas são o resultado apenas dos atributos, e sua causa é o Pradhāna (natureza).
28- शब्दादिषु पञ्चानामालोचनमात्रमिष्यते वृत्तिः । वचनादानविहरणोत्सर्गानन्दाश्च पञ्चानाम् ॥ २८॥
śabdādiṣu pañcānāmālocanamātramiṣyate vṛttiḥ । vacanādānaviharaṇotsargānandāśca pañcānām ॥ 28॥
शब्ददि [śabdādi] em relação ao som e ao resto* पञ्च [pañca] a função dos cinco (sentidos)* इष्यते मात्र आलोचन [iṣyate mātra ālocana] é considerada mera percepção (ālocana)* पञ्चा वृत्ति [pañcā vṛtti] (enquanto) as funções dos outros cinco (órgãos de ação)* वचन आदान विहरण उत्सर्ग च आनन्द [vacana ādāna viharaṇa utsarga ca ānanda] (são a) fala, manipulação, locomoção, excreção, e prazer sexual*
28- A função dos cinco órgãos dos sentidos em relação ao som, tato, forma, cheiro e sabor, é uma mera percepção chamada "ālocana"; enquanto as funções dos outros cinco órgãos de ação são a fala, a manipulação, a locomoção, a excreção e o prazer sexual.
Gauḍapāda: A palavra mātra refere-se ao senso de singularidade ou à exclusão do que não é especificado, isto é, nenhuma outra especialidade. Portanto, o olho funciona apenas em relação à forma, a língua e o resto, se assemelham. Isto é, o objeto do olho é a forma; da língua é o gosto; do nariz é o cheiro; do ouvido é o som; e da pele é toque. Assim, o contexto do funcionamento dos órgãos dos sentidos foi descrito.
Agora, está descrito o contexto de funcionamento relacionado aos órgãos de ação: O aparelho fonador fala, as mãos agem, os pés andam, o ânus excreta e os órgãos de procriação proporcionam prazer e progênie; estas são as funções de cada órgão ativo.
29- स्वालक्षण्यं वृत्तिस्त्रयस्य सैषा भवत्यसामान्या । सामान्यकरणवृत्तिः प्राणाद्या वायवः पञ्च ॥ २९॥
svālakṣaṇyaṃ vṛttistrayasya saiṣā bhavatyasāmānyā । sāmānyakaraṇavṛttiḥ prāṇādyā vāyavaḥ pañca ॥ 29॥
त्रय [traya] dos três instrumentos internos (buddhi, ahaṃkāra e manas)* स्व लक्षण वृत्ति [sva lakṣaṇa vṛtti] cada um tem a sua própria função* स एष असामान्य भवति [sa eṣa asāmānya bhavati] e essas funções são inerentes a cada um deles* पञ्च वायव प्राण आद्य [pañca vāyava prāṇa ādya] (mas) as funções dos cinco ares (prāṇa, apāna, udāna, vyāna e samāna)* सामान्य करण वृत्ति [sāmānya karaṇa vṛtti] são comuns a todos os três instrumentos internos*
29- Dos três instrumentos internos (buddhi, ahaṃkāra e manas), cada um tem a sua própria função que não é comum a todos eles; mas as funções dos cinco ares (Prāṇa, Apāna, Udāna, Vyāna e Samāna) são comuns a todos os três instrumentos internos.
Gauḍapāda: A natureza específica de cada um deles significa as características únicas. A definição de intelecto foi anteriormente dada como deliberação, que é também função do intelecto. Da mesma forma, afirmou-se que “o ahaṃkāra é autoconsciência”, e esta também é a função do ahaṃkāra. “Mente é determinante” e a definição da mente e a função da mente é determinativa. Assim, a função dos três é também a natureza específica de cada um. As funções dos órgãos de sentido e ação, que foram explicadas antes, também são específicas. Portanto, as funções específicas dos três não são comuns.
Agora, a função que é comum é explicada. A função comum dos três órgãos internos são os cinco ares vitais: prāṇa, apāna, samāna, udāna e vyāna. Prāṇa reside dentro da boca e do nariz. Sua circulação é a função comum de todos os treze órgãos desde que os órgãos surgem quando há prāṇa. Prāṇa, como um pássaro em uma gaiola, dá movimento a todos. É chamado prāṇa por causa da respiração. Apāna é assim chamado porque tira. Sua circulação também é a função comum dos órgãos. O Samāna, que reside no centro do corpo, é assim chamado porque distribui a energia alimentar e o resto adequadamente. Da mesma forma, udana é assim chamado porque carrega ou puxa ou levanta. Ele reside entre o umbigo e a cabeça. A circulação de udana é a função comum de todos os órgãos. Além disso, o que permeia o corpo e divide seu interior é vyana. É assim chamado porque permeia o corpo como espaço. Sua circulação é a função comum de todos os órgãos. Assim, esses cinco ares são explicados como a função comum de todos os órgãos.
30- युगपच्चतुष्टयस्य तु वृत्तिः क्रमशश्च तस्य निर्दिष्टा । दृष्टे तथाप्यदृष्टे त्रयस्य तत्पूर्विका वृत्तिः ॥ ३०॥
yugapaccatuṣṭayasya tu vṛttiḥ kramaśaśca tasya nirdiṣṭā । dṛṣṭe tathāpyadṛṣṭe trayasya tatpūrvikā vṛttiḥ ॥ 30॥
दृष्ट [dṛṣṭa] com relação aos objetos visíveis* निर्दिष्टा चतुष्टय तु युगपद् वृत्ति क्रम च तस्य [nirdiṣṭa catuṣṭaya tu yugapad vṛtti krama ca tasya] a função dos quatro (os três órgãos internos e um órgão dos sentidos) é simultânea e gradual* तथा अपि अदृष्ट [tathā api adṛṣṭa] assim também com relação aos objetos invisíveis* त्रय वृत्ति [traya vṛtti] a função dos três (órgãos internos)* तत् पूर्विका [tat pūrvikā] é precedida pelo quarto (órgão do sentido)*
30- Com relação aos objetos visíveis, a função dos quatro (os três órgãos internos e um órgão dos sentidos) é simultânea e gradual. Assim também, com relação aos objetos invisíveis, a função dos três (órgãos internos) é precedida pelo quarto (órgão do sentido).
Gauḍapāda: Buddhi (Intelecto), Ahaṃkāra (ego) e Manas (mente), quando unidos a qualquer um dos órgãos, tornam-se quatro. Com os quatro, o funcionamento em relação aos objetos visíveis é simultâneo. Intelecto, ego, mente e olho percebem simultaneamente a forma. O intelecto, o ego, a mente e a língua apreendem simultaneamente o gosto. O intelecto, o ego, a mente e o nariz simultaneamente apreendem o olfato. Assim é com a pele e os ouvidos.
Há também o funcionamento gradual dos quatro. Por exemplo, um homem que anda no caminho vê algo de longe e está cercado de dúvidas sobre se ele vê um poste ou um homem. Então ele vê alguma marca ou um pássaro sobre ele e o intelecto surge em sua mente duvidosa, determinando que é um poste. Daí vem o ego para confirmar de que é um poste. Assim, o funcionamento gradual do intelecto, do ego, da mente e dos olhos pode ser entendido. Como é no caso de forma; é no caso do som e do resto. Visível refere-se a objetos presentes.
Além disso, no que diz respeito aos objetos invisíveis, a função dos três é precedida pela função de um órgão dos sentidos. O invisível significa formas passadas e futuras. E da mesma forma, no caso da forma, o funcionamento do intelecto, ego e mente é precedido pelo do olho; no toque é precedido pelo da pele; no cheiro é precedido pelo nariz; no gosto é precedido pelo da língua; no som é precedido pelo do ouvido. No que diz respeito ao futuro e ao passado, a função do intelecto, ego e mente precedida por qualquer outro órgão é gradual. No que diz respeito ao presente, é simultâneo e gradual.
31- स्वां स्वां प्रतिपद्यन्ते परस्पराकूतहेतुकां वृत्तिम् । पुरुषार्थैव हेतुर्न केनचित् कार्यते करणम् ॥ ३१॥
svāṃ svāṃ pratipadyante parasparākūtahetukāṃ vṛttim । puruṣārthaiva heturna kenacit kāryate karaṇam ॥ 31॥
प्रति पद्य स्वा स्वा वृत्ति [prati padya svā svā vṛtti] os órgãos executam suas respectivas funções*
परस्पर आकूत हेतु [paraspara ākūta hetu] incitados pelos impulsos mútuos* पुरुष अर्थ एव हेतु [puruṣa artha eva hetu] o propósito do puruṣa é o único motivo* न केनचित् कार्य करण [na kenacit kārya karaṇa] por nenhuma outra razão um órgão é levado a agir*
31- Os órgãos executam suas respectivas funções incitados pelos impulsos mútuos. O propósito do Puruṣa é o único motivo; Por nenhuma outra razão um órgão é levado a agir.
Gauḍapāda: Svam repetido é para indicar a respectiva propriedade. O intelecto, o ahaṃkāra e a mente realizam suas respectivas funções incitadas por impulsos mútuos. Ākūta significa respeito ou zelo. Intelecto, ahaṃkāra, mente e o resto tendem a realizar o objetivo do Puruṣa. O intelecto procede à sua função particular depois de conhecer o impulso do ahaṃkāra.
Se for perguntado, “qual é o motivo?” O motivo é o objetivo do Puruṣa. O objetivo do Puruṣa é alcançado pela ação dos guṇas. Portanto, esses órgãos manifestam o objetivo do Puruṣa.
Como eles agem por vontade própria quando não são inteligentes? Um órgão não é obrigado a funcionar por ninguém. O significado desta frase é que o objetivo do Puruṣa faz com que eles funcionem. Os órgãos não são causados ou acionados por nenhum ser superior.
32- करणं त्रयोदशविधं तदाहरणधारणप्रकाशकरम् । कार्यं च तस्य दशधाहार्यं धार्यं प्रकाश्यं च ॥ ३२॥
karaṇaṃ trayodaśavidhaṃ tadāharaṇadhāraṇaprakāśakaram । kāryaṃ ca tasya daśadhāhāryaṃ dhāryaṃ prakāśyaṃ ca ॥ 32॥
करण त्रयोदशविध [karaṇa trayodaśavidha] os órgãos são de treze tipos* तत् आहरण धारण प्रकाशकर [tat āharaṇa dhāraṇa prakāśakara] suas (funções são) apreender reter e manifestar* च तस्य कार्य [ca tasya kārya] e seus objetos* दशध [daśadha] (são) de dez tipos* अहार्य [ahārya] os apreendidos* धार्य [dhārya] os sustentados* च [ca] e* प्रकाश्य [prakāśya] os iluminados*
32- Os órgãos são de treze tipos; suas funções são apreender, reter e manifestar. Seus objetos são de dez tipos: os apreendidos, os sustentados e os iluminados.
Gauḍapāda: Os órgãos, o mahat e o resto, são treze: intelecto, ahaṃkāra, mente, cinco órgãos dos sentidos e cinco órgãos da ação. Suas funções são apreender, reter e manifestar. Agarrar e reter são executados pelos órgãos de ação e os manifestados pelos órgãos dos sentidos.
Os objetos ou funções a serem executados por esses órgãos são décuplos. Os dez tipos de objetos e funções são som, toque, forma, gosto, cheiro, falar, tomar, andar, excretar e gozar. Eles são manifestados pelos órgãos dos sentidos e são apreendidos e retidos pelos órgãos da ação.
33- अन्तःकरणं त्रिविधं दशधा बाह्यं त्रयस्य विषयाख्यम् । साम्प्रतकालं बाह्यं त्रिकालमाभ्य१न्तरं करणम् ॥ ३३॥
antaḥkaraṇaṃ trividhaṃ daśadhā bāhyaṃ trayasya viṣayākhyam । sāmpratakālaṃ bāhyaṃ trikālamābhya1ntaraṃ karaṇam ॥ 33॥
अन्तःकरण त्रिविध [antaḥkaraṇa trividha] os órgãos internos são de três tipos* बाह्य दशधा [bāhya daśadhā] os órgãos externos (constituidos por) dez tipos* त्रय विषय [traya viṣaya] tornam os objetos conhecidos pelos três órgãos internos* बाह्य साम्प्रतकाल [bāhya sāmpratakāla] os órgãos externos (funcionam) no presente* आभ्यन्तर करण त्रिकाल [ābhyantara karaṇa trikāla] os órgãos internos (funçionam) nos três tempos (passado, presente e futuro)*
33- Os órgãos internos são de três tipos; os órgãos externos constituidos por dez tipos, tornam os objetos conhecidos pelos três órgãos internos; os órgãos externos funcionam no presente; os órgãos internos funcionam no passado, no presente e no futuro.
Gauḍapāda: O órgão interno é tríplice (intelecto, ahaṃkāra e mente), e o externo é décuplo (cinco órgãos dos sentidos e cinco órgãos da ação). Esses dez são os objetos experienciados pelo intelecto, ahaṃkāra e mente.
Os cinco órgãos dos sentidos e cinco órgãos da ação funcionam apenas no presente. Os ouvidos ouvem apenas o som presente; os olhos vêem apenas a forma atual; a pele sente apenas o toque presente; a língua saboreia o sabor atual, o nariz cheira o aroma presente. Analogamente, os órgãos de ação: a fala pronuncia a palavra presente; as mãos tomam o objeto presente; os pés andam no caminho atual; e o ânus e os órgãos da procriação funcionam no presente.
Os órgãos internos funcionam nos três tempos do passado, presente e futuro. O intelecto, o ahaṃkāra e a mente apreendem seus objetos em todos os três momentos. O intelecto reconhece um jarro no presente, passado ou futuro; o ego é autoconsciente do presente, passado ou futuro; e a mente pondera sobre o presente, passado ou futuro. Agora é explicado qual dos órgãos apreende objetos específicos e qual apreende os não específicos.
34- बुद्धीन्द्रियाणि तेषां पञ्च विशेषाविशेषविषयाणि । वाग्भवति शब्दविषया शेषाणि तु पञ्चविषयाणि ॥ ३४॥
buddhīndriyāṇi teṣāṃ pañca viśeṣāviśeṣaviṣayāṇi । vāgbhavati śabdaviṣayā śeṣāṇi tu pañcaviṣayāṇi ॥ 34॥
तेषां पञ्च बुद्धि इन्द्रिय [teṣāṃ pañca buddhi indriya] destes os cinco órgãos dos sentidos* विशेष अविशेष विषय [viśeṣa aviśeṣa viṣaya] apreendem objetos específicos e não específicos* वच् भवति शब्द विषय [vāc bhavati śabda viṣaya] a fala tem o som como objeto* तु शेष पञ्च विषय [tu śeṣa pañca viṣaya] mas o resto (os órgãos de ação) têm cinco objetos*
34- Destes, os cinco órgãos dos sentidos apreendem objetos específicos e não específicos, a fala tem o som como objeto; O resto (os órgãos de ação) têm cinco objetos.
Gauḍapāda: Os órgãos dos sentidos apreendem objetos específicos: som, tato, forma, gosto e cheiro, e estes são dotados de prazer, dor e ilusão. No caso dos devas, os órgãos do sentido manifestam objetos não específicos.
Entre os órgãos de ação, a fala tem o som como objeto. A fala dos devas, assim como dos seres humanos, profere versos e o resto. Portanto, o órgão da fala é semelhante no caso de devas e seres humanos.
O resto, mãos, pés, o ânus e os órgãos de procriação, têm som e o resto como seus objetos. Som, toque, forma, paladar e olfato estão presentes nas mãos. Os pés caminham pelo chão dotado de cinco objetos. O ânus excreta o que é dotado dos cinco (mahābhūtas). Da mesma forma, o órgão de procriação produz prazer com as cinco características.
35- सान्तःकरणा बुद्धिः सर्वं विषयमवगाहते यस्मात् । तस्मात् त्रिविधं करणं द्वारि द्वाराणि शेषाणि ॥ ३५॥
sāntaḥkaraṇā buddhiḥ sarvaṃ viṣayamavagāhate yasmāt । tasmāt trividhaṃ karaṇaṃ dvāri dvārāṇi śeṣāṇi ॥ 35॥
यस्मात् बुद्धि शान्त करण [yasmāt buddhi śānta karaṇa] desde que buddhi com os outros (dois) órgãos internos* सर्व अवगाह विषय [sarva avagāha viṣaya] apreende todos os objetos* तस्मात् त्रिविध करण द्वारि [tasmāt trividha karaṇa dvāri] então estes três órgãos são os porteiros* शेष द्वाराणि [śeṣa dvārāṇi] (e) o resto são os portões*
35- Desde que Buddhi com os outros (dois) órgãos internos, apreende todos os objetos, estes três órgãos (internos) são os porteiros e o resto são os portões.
Gauḍapāda: O Intelecto, o ahaṃkāra e a mente apreendem o som e o resto em todos ao três momentos, portanto, estes três são os porteiros e os órgãos são os portões.
36- एते प्रदीपकल्पाः परस्परविलक्षणा गुणविशेषाः । कृत्स्नं पुरुषस्यार्थं प्रकाश्य बुद्धौ प्रयच्छन्ति ॥ ३६॥
ete pradīpakalpāḥ parasparavilakṣaṇā guṇaviśeṣāḥ । kṛtsnaṃ puruṣasyārthaṃ prakāśya buddhau prayacchanti ॥ 36॥
एते [ete] estes (dez órgãos externos, manas e ahaṁkāra)* परस्पर विलक्षणा [paraspara vilakṣaṇā] diferentes uns dos outros* गुण विशेष [guṇa viśeṣa] são derivados dos guṇas* कृत्स्न प्रकाश [kṛtsna prakāśa] iluminam todos os objetos* प्रदीप कल्प [pradīpa kalpa] como uma lâmpada* प्रयच्छन्ति बुद्धि [prayacchanti buddhi] e os apresentam ao intelecto (buddhi)* पुरुष अर्थ [puruṣa artha] para apreciação do puruṣa*
Gauḍapāda: Todos os órgãos mencionados acima são as modificações específicas dos guṇas e funcionam como uma lâmpada. Ou seja, eles revelam os objetos para o Puruṣa, de maneira semelhante à forma como a luz da lâmpada ilumina objetos.Uma vez que os órgãos dos sentidos, os órgãos de ação, ahaṁkāra e mente revelam seus respectivos objetos, eles os apresentam ao intelecto. O Puruṣa experiencia o prazer e tudo o mais que surge dos objetos, quando são apresentados ao intelecto.
36- Estes (os dez órgãos externos, manas e ahaṁkāra) diferentes uns dos outros, são derivados dos guṇas, iluminam todos os objetos como uma lâmpada e os apresentam ao intelecto (buddhi) para apreciação do Puruṣa.
Gauḍapāda: Todos os órgãos mencionados acima são as modificações específicas dos guṇas e funcionam como uma lâmpada. Ou seja, eles revelam os objetos para o Puruṣa, de maneira semelhante à forma como a luz da lâmpada ilumina objetos.Uma vez que os órgãos dos sentidos, os órgãos de ação, ahaṁkāra e mente revelam seus respectivos objetos, eles os apresentam ao intelecto. O Puruṣa experiencia o prazer e tudo o mais que surge dos objetos, quando são apresentados ao intelecto.
Sāṃkhya kārikā de Iśvarakṛṣṇa com comentários de Gaudapādā / [37 - 54]
37- सर्वं प्रत्युपभोगं यस्मात् पुरुषस्य साधयति बुद्धिः । सैव च विशिनष्टि पुनः प्रधानपुरुषान्तरं सूक्ष्मम् ॥ ३७॥
sarvaṃ pratyupabhogaṃ yasmāt puruṣasya sādhayati buddhiḥ । saiva ca viśinaṣṭi punaḥ pradhānapuruṣāntaraṃ sūkṣmam ॥ 37॥
यस्मात् बुद्धि पुरुष साधयति उपभोग [yasmāt buddhi sādhayati puruṣa upabhoga] buddhi é quem garante a experiência do Puruṣa* प्रति सर्व [prati sarva] em relação a todos (objetos em todos os momentos)* च स एव पुनर् विशिनष्टि [ca sa eva punar viśinaṣṭi] também é essa (Buddhi) que discrimina* सूक्ष्म पुरुष अङ्तरं प्रधान [sūkṣma puruṣa aṅtaraṃ pradhāna] também é essa (Buddhi) que discrimina a diferença sutil entre a Prakṛti e o Puruṣa*
37- Buddhi é quem viabiliza a experiência do Puruṣa, também é essa (Buddhi) que discrimina a diferença sutil entre a Prakṛti e o Puruṣa.
Vācaspati Miśra: "Os órgãos agem, somente, para servir ao propósito do Puruṣa; Buddhi faz isso diretamente; portanto, somente ela é considerada o Órgão Principal, assim como o Governador é considerado superior a todos os outros chefes em virtude de ser o agente direto do Rei, enquanto outros, como os chefes da aldeia, etc. são de importância secundária quando em comparação com o primeiro. Somente a Buddhi realiza a experiência de todos os objetos para o Puruṣa, simulando ser o próprio Puruṣa devido ao reflexo do Puruṣa em Buddhi, devido à sua proximidade com o Puruṣa. A vivência consiste no desfrute de sentimentos de prazer e dor; esse sentimento ocorre em Buddhi; A Buddhi aparece como se tivesse assumido a forma do Puruṣa; assim, a Buddhi faz o Puruṣa viver essas experiências. Assim como a percepção, a observação e a autoconsciência das coisas são transmitidas à Buddhi assumindo suas próprias formas, as funções dos sentidos também, de maneira semelhante, são identificadas com Buddhi em sua própria operação na forma de determinar. É como as tropas do chefe da aldeia se unificando com as tropas do governador. De um modo semelhante, a Buddhi realiza, para as experiências do Puruṣa, todas as coisas na forma de som, etc".
38- तन्मात्राण्यविशेषास्तेभ्यो भूतानि पञ्च पञ्चभ्यः । एते स्मृता विशेषाः शान्ता घोराश्च मूढाश्च ॥ ३८॥
tanmātrāṇyaviśeṣāstebhyo bhūtāni pañca pañcabhyaḥ । ete smṛtā viśeṣāḥ śāntā ghorāśca mūḍhāśca ॥ 38॥
तन्मात्र अविशेष [tanmātra aviśeṣa] os tanmātras são aviśeṣa (não específicos)* तेभ्यस् पञ्चभ्यः [tebhyas pañcabhyaḥ] desses cinco* पञ्च भूत [pañca bhūta] (procedem) os cinco pañcabhūtas* एते स्मृतास् विशेष [ca ete smṛtās viśeṣa] estes são chamados de viśeṣa (específicos)* च शाङ्तस् घोरस् च मूढस् [ca śāṅtas ghoras ca mūḍhas] e são tranquilos, violentos e ilusórios*
38- Os Tanmātras são 'não específicos' (aviśeṣa); destes cinco tanmātras procedem os cinco pañcabhūtas; que são chamados de específicos (viśeṣa) e são tranquilos, violentos e ilusórios.
Gauḍapāda: Os cinco Tanmātras (elementos sutis) produzidos pelo ahaṁkāra são som, toque, forma, gosto e cheiro. Estes são chamados não específicos. Eles são os objetos dos devas, apreendidos apenas pelos devas e têm a característica de prazer, sem dor e ilusão.
Destes cinco elementos sutis são produzidos os cinco elementos densos, terra, água, fogo, ar e espaço. Do elemento sutil do cheiro, deriva a terra; do elemento sutil do gosto, a água; do elemento sutil da forma, o fogo; do elemento sutil do toque, o ar; do elemento sutil do som, o espaço; esses cinco (tanmātras) são produzidos para formar os elementos brutos, que são chamados de específicos.
Esses objetos específicos são apreendidos pelos humanos e podem ser tranquilos, tendo a característica de prazer; violência, tendo a característica de dor; ou ilusório, produzindo delírio. Assim como o elemento espaço é tranquilo, dando prazer a uma pessoa que sai de um quarto fechado; o mesmo se torna violento dando dor a uma pessoa que é afetada pelo frio, calor, vento e chuva; e o mesmo se torna ilusório para uma pessoa que se perdeu em uma floresta. Da mesma forma, o vento é tranquilo para uma pessoa oprimida pelo calor; agride a pessoa oprimida por um resfriado; e ilusório quando misturado com areia e poeira. O mesmo pode ser dito do fogo e do resto.
39- सूक्ष्मा मातापितृजाः सह प्रभूतैस्त्रिधा विशेषाः स्युः । सूक्ष्मास्तेषां नियता मातापितृजा निवर्तन्ते ॥ ३९॥
sūkṣmā mātāpitṛjāḥ saha prabhūtaistridhā viśeṣāḥ syuḥ । sūkṣmāsteṣāṃ niyatā mātāpitṛjā nivartante ॥ 39॥
सूक्ष्म मातापितृज सह प्रभूत [sūkṣma mātāpitṛja saha prabhūta] os elementos sutis, os corpos nascidos de pais e os elementos densos* स्यू त्रिधा विशेष [syū tridhā viśeṣa] são os três objetos específicos (Viśeṣa)* तेषां सूक्ष्म नियत [teṣāṃ sūkṣma niyata] destes os corpos sutis são permanentes* मातापितृज निवर्तण्ते [mātāpitṛja nivartaṇte] e os nascidos dos pais são perecíveis*
39- Os elementos sutis, os corpos nascidos de pais e os elementos densos são os três objetos específicos (Viśeṣa). Destes, os corpos sutis são permanentes e os nascidos dos pais são perecíveis.
Gauḍapāda: O corpo sutil composto e caracterizado pelo intelecto, ahaṁkāra, onze órgãos e cinco elementos sutis, sempre existe e passa por transmigração. O corpo denso nasce dos pais, que é composto da mistura de fluidos seminais dos pais e depois nutrido pelos elementos densos na forma de comida e bebida tomadas pela mãe.
O corpo assim iniciado pelos três objetos específicos - os elementos sutis, o nascimento dos pais e os elementos densos - é equipado com estômago, coxas, peito, cabeça e o resto, e é envolvido por seis emvoltórios. É dotado de sangue, carne, tendões, sêmen, ossos e medula que são compostos dos cinco elementos densos. O ākāśa fornece espaço; o vento fornece crescimento; fogo fornece calor; a água fornece agregação e a terra fornece estabilidade. Assim dotado de todos os membros, o corpo sai do ventre da mãe.
Os sutis chamados tanmatras são permanentes. O corpo iniciado por eles e impulsionado por ações realizadas em nascimentos anteriores migra para as espécies de animais, cervos, pássaros, répteis e objetos imóveis. Impelido por ações virtuosas, migra para as regiões de Indra e outras. Assim, esse corpo sutil migra até que a sabedoria discriminativa seja alcançada. Depois de atingir essa sabedoria, uma pessoa sábia deixa o corpo e alcança a salvação. Portanto, esses objetos específicos sutis são permanentes.
Aqueles nascidos de pais são perecíveis. No momento da morte, o corpo nascido dos pais é abandonado e seus elementos são dissolvidos na terra e no resto.
40- पूर्वोत्पन्नमसक्तं नियतं महदादिसूक्ष्मपर्यन्तम् । संसरति निरुपभोगं भावैरधिवासितं लिङ्गम् ॥ ४०॥
pūrvotpannamasaktaṃ niyataṃ mahadādisūkṣmaparyantam । saṃsarati nirupabhogaṃ bhāvairadhivāsitaṃ liṅgam ॥ 40॥
लिङ्ग [liṅga] o corpo sutil (liṅga)* पूर्व उत्पन्न [pūrva utpanna] produzido originalmente* असक्त [asakta] é independente* नियत [niyata] permanente* पर्यन्त महत् आदि सूक्ष्म [paryanta mahat ādi sūkṣma] composto por mahat até os elementos sutis (tattvas)* संसर निरुप भोग अधिवासित भाव [saṃsara nirupa bhoga adhivāsita bhāva] transmigra é livre da experiência e é dotado com bhâvas (disposições)*
40- O Liṅga (Corpo sutil), produzido originalmente, é independente, permanente, composto por mahat até os elementos sutis (tattvas). Transmigra, é livre da experiência e é dotado com bhâvas (disposições).
Gauḍapāda: Na primeira projeção da natureza, é formado o corpo sutil. De fato independente. Isto é, não está ligado aos estados humanos divinos ou animais. Por causa da sutileza, não sofre impedimentos em qualquer local. Migra ou se move, com a sua marcha desimpedida através das montanhas e do resto.
Ele migra até que o conhecimento discriminativo seja totalmente alcançado. É composto de intelecto, ahaṁkāra, mente e os cinco elementos sutis, e migra, movendo-se através dos três mundos. É desprovido de prazer, mas torna-se capaz de gozo quando assume atividade através de um corpo externo nascido dos pais. É dotado de disposições, virtude e o resto, ou é afetado ou influenciado por eles.
No momento da dissolução, mahat e o resto, até os elementos sutis, fundem-se na Prakṛti. Quando não estão migrando, permanecem intactos na Prakṛti. Quando a Prakṛti projeta uma nova criação, o sutil linga migra novamente.
41- चित्रं यथाश्रयमृते स्थाण्वादिभ्यो विना यथा छाया । तद्वद् विना विशेषैर्न तिष्ठति निराश्रयं लिङ्गम् ॥ ४१॥
citraṃ yathāśrayamṛte sthāṇvādibhyo vinā yathā chāyā । tadvad vinā viśeṣairna tiṣṭhati nirāśrayaṃ liṅgam ॥ 41॥
यथा चित्र आश्रय ऋत [yathā citra āśraya ṛta] assim como uma imagem não pode existir sem um substrato (tela)* यथा छाया स्थाणु आदि विना [yathā chāyā sthāṇu ādi vinā] ou uma sombra sem um obstáculo (poste, etc.)* तद्वत् लिङ्ग न तिष्ठति [tadvat liṅga na tiṣṭhati] também liṅga (buddhi) não pode se manifestar* निराश्रय विशेष विना [nirāśraya viśeṣa vinā] sem suporte, sem um corpo sutil (Viśeṣa)*
41- Assim como uma imagem não pode existir sem um substrato (tela), ou uma sombra sem um obstáculo, também liṅga (buddhi) não pode se manifestar sem um suporte, sem um corpo sutil (Viśeṣa).
Vācaspati Miśra: Liṅga no texto significa Buddhi e o resto (isto é, ahaṁkāra, a mente, os sentidos e os cinco tanmātras) porque eles tornam as coisas conhecidas e que não podem subsistir sem um substrato. Aqui, a seguinte teoria é dada: "Durante o período intermediário entre a morte e o renascimento, Buddhi e o resto são apoiados por um corpo refinado; porque são dotados dos cinco elementos primários refinados; como o Buddhi etc, como encontrado no corpo físico percebido. 'Sem o corpo específico, isto é, sem o corpo sutil. Há um texto reverenciado em relação a isso: "Então Yama extraiu à força o Puruṣa do tamanho do polegar" (do corpo de Satyavān - Mahābhārata). Aqui, o Puruṣa do tamanho do polegar implica o fato de ser o corpo sutil por causa da impossibilidade da extração de Puruṣa. Como tal, o Puruṣa aqui representa apenas o corpo sutil. Aqui a palavra Puruṣa tem o sentido daquilo que dorme no corpo grosseiro (puri śete). Tendo assim explicado a existência do corpo sutil, o autor em seguida declara a razão e o modo de sua migração:
42- पुरुषार्थहेतुकमिदं निमित्तनैमित्तिकप्रसङ्गेन । प्रकृतेर्विभुत्वयोगान् नटवद् व्यवतिष्ठते लिङ्गम् ॥ ४२॥
puruṣārthahetukamidaṃ nimittanaimittikaprasaṅgena । prakṛtervibhutvayogān naṭavad vyavatiṣṭhate liṅgam ॥ 42॥
इदम् लिङ्ग [idam liṅga] o liṅga (corpo sutil)* पुरुष अर्थ हेतुक [puruṣa artha hetuka] para o propósito do puruṣa* निमित्त नैमित्तिक प्रसङ्ग [nimitta naimittika prasaṅga] través de sua conexão com os meios e seus resultados* प्रकृति विभुति योग [prakṛti vibhuti yoga] e com o poder da prakṛti* व्यवतिष्ठते नटवत् [vyavatiṣṭhate naṭavat] age como um ator*
42- Para o propósito do Puruṣa, o corpo sutil (liṅga), através de sua conexão com os meios e seus resultados, e com o poder da Prakṛti, age como um ator.
Gauḍapāda: Para que finalidade o liṅga sofre incarnação? A Prakṛti funciona de modo que o objetivo do Puruṣa seja alcançado. Esse objetivo é duplo: a apreensão do som e do resto e a obtenção de discriminação entre o Puruṣa e os atributos. A apreensão do som e o resto é a obtenção do prazer do som e o resto. A obtenção de discriminação entre o Puruṣa e os atributos é salvação.
Portanto, é dito que este corpo sutil está ativo para o propósito do Puruṣa através de sua conexão com os meios e seus resultados. Os meios são a virtude e o resto e os resultados são ascendenr ao céu ou evolução. Assim como um rei, sendo poderoso em seu reino pode fazer o que quiser; Da mesma forma, por conta da suprema autoridade da Prakṛti sobre tudo, o liṅga age através de sua conexão com os meios e seus resultados. Ou seja, a Prakṛti determina as condições do liṅga ao assumir corpos diferentes.
O corpo sutil, liṅga, composto de minúsculas partículas, elementos sutis e dotado de treze órgãos, atua nos corpos de devas, homens e bestas como um ator. Assim como um ator entrando em cena pode sair como um deva, ou como um homem e depois como um bufão; o corpo sutil, através de sua conexão com os meios e seus resultados, entra no útero e sai como um tigre, um elefante ou uma pessoa.
43- सांसिद्धिकाश्च भावाः प्राकृतिका वैकृताश्च धर्माद्याः । दृष्टाः करणाश्रयिणः कार्याश्रयिणश्च कललाद्याः ॥ ४३॥
sāṃsiddhikāśca bhāvāḥ prākṛtikā vaikṛtāśca dharmādyāḥ । dṛṣṭāḥ karaṇāśrayiṇaḥ kāryāśrayiṇaśca kalalādyāḥ ॥ 43॥
भाव धर्म आदि [bhāva dharma ādi] as disposições a virtude e o resto* सांसिद्धिक च प्रकृति च वैकृतिक [sāṃsiddhika ca prakṛti ca vaikṛtika] são inatas naturais e adquiridas* दृष्ट करण आश्रय [dṛṣṭa karaṇa āśraya] elas são vistas residindo em buddhi* कलल आदि [kalala ādi] o embrião e o resto* च कार्य आश्रय [ca kārya āśraya] subsistem no efeito (o corpo)*
43- As disposições, a virtude e o resto são inatas, naturais e adquiridas. Elas são vistas residindo em Buddhi. O embrião e o resto subsistem no efeito (o corpo).
Gauḍapāda: Acredita-se que o corpo sutil (liṅga) migra equipado das disposições (bhāvas). As disposições são consideradas de três tipos: inata, natural e adquirida. As disposições inatas são virtude, conhecimento, não-apego e poder. Elas surgiram junto com a criação. As naturais são o resultado da relação entre causa e efeito. Em outras palavras, elas são o resultado dos méritos realizados em nascimentos anteriores. Portanto, essas disposições são chamadas naturais. As disposições adquiridas são desenvolvidas através do esforço nos humanos...Dotado dessas disposições, o corpo sutil migra. As disposições são oito: virtude, conhecimento, não-apego, poder, vício, ignorância, apego e ausência de poder. Essas oito disposições subsistem ou são mantidas no intelecto. O intelecto é determinação, virtude, conhecimento e assim por diante. O efeito das disposições mantidas no intelecto é o corpo...
44- धर्मेण गमनमूर्ध्वं गमनमधस्ताद् भवत्यधर्मेण । ज्ञानेन चापवर्गो विपर्ययादिष्यते बन्धः ॥ ४४॥
dharmeṇa gamanamūrdhvaṃ gamanamadhastād bhavatyadharmeṇa । jñānena cāpavargo viparyayādiṣyate bandhaḥ ॥ 44॥
धर्म गमन ऊर्ध्व [dharma gamana ūrdhva] pela virtude (há) movimento ascendente (há progresso)* अधर्म भवति तद् गमनम अधस् [adharma bhavati tad gamana adhas] através do vício (há) movimento descendente (regresso)* च ज्ञान अपवर्गः [ca jñāna apavargaḥ] através do conhecimento (vem) a liberdade* विपर्यय इष्यते बन्ध [viparyaya iṣyate bandha] e através do seu oposto (ignorância) vem a escravidão*
44- Pela virtude, há progresso e, através do vício, regresso; Através do conhecimento, vem a liberdade e, através do seu oposto (ignorância) vem a escravidão.
Gauḍapāda: Uma pessoa se eleva por meio da virtude. Acima estão as oito regiões de Brahma. Com virtude, o corpo sutil se eleva. Influenciado pelo vício, o corpo sutil migra para os corpos de animais, cervos, pássaros, répteis e objetos imóveis.
Através do conhecimento, a liberação é adquirida. A liberação é o conhecimento dos vinte e cinco princípios. Por este instrumento de conhecimento, a liberdade é atingida. Então o corpo sutil cessa e o Puruṣa é liberto (apavarga).
Ignorância traz escravidão chamada prakrta (inata), vaikrta (natural) e daksina (pessoal). Isso será explicado mais adiante. Aquele que está preso pelas amarras naturais e pessoais, não é liberado por nada exceto pelo conhecimento.
45- वैराग्यात् प्रकृतिलयः संसारो भवति राजसाद्१ रागात् । ऐश्वर्यादविघातो विपर्ययात् तद्विपर्यासः ॥ ४५॥
vairāgyāt prakṛtilayaḥ saṃsāro bhavati rājasād1 rāgāt । aiśvaryādavighāto viparyayāt tadviparyāsaḥ ॥ 45॥
वैराग्य प्रकृति लय [vairāgya prakṛti laya] vairāgya ou desapego (resulta) em fusão na prakṛti* राजस राग [rājasa rāga] do apego em rajas (guṇa)* संसार भवति [saṃsāra bhavati] torna um homem ligado ao mundo* ऐश्वर्य अविघात [aiśvarya avighāta] o poder super natural leva à não-obstrução do desejo (permite obter o que ele deseja)* विपर्यय तद् विपर्यास [viparyaya tad viparyāsa] o oposto resulta no contrário*
45- Desapego (vairāgya) resulta em fusão em Prakṛti; Do apego em rajas (guṇa), torna um homem ligado ao mundo. O poder super natural leva à não-obstrução do desejo (permite obter o que ele deseja), o oposto resulta no contrário.
Gauḍapāda: Considere alguém desapegado (sem apegos), mas que não tenha conhecimento dos princípios (tattvas). Então, através desse não-apego precedido pela ignorância, surge a absorção pela Prakṛti. Após a morte, essa pessoa é absorvida pelos oito envolventes: Prakṛti, intelecto, ahaṃkara e os cinco elementos sutis e não obtém nenhuma liberação. Ele ou ela transmigra novamente.
E mesmo com relação a este apego (apaixonado) rājas, “Eu realizo o sacrifício e dou presentes para que eu possa desfrutar da felicidade divina e humana no céu e na terra”. Esse apego apaixonado também resulta em transmigração.
O poder é óctuplo e é composto por animā e o resto. Isso não resulta em nenhum obstáculo ao poder nas regiões de Brahman e no resto. Por último, através da falta de poder, empecilhos e os obstáculos vêm por toda parte.
46- एष प्रत्ययसर्गो विपर्ययाशक्तितुष्टिसिद्ध्याख्यः । गुणवैषम्यविमर्दात् तस्य च भेदास्तु पञ्चाशत् ॥ ४६॥
eṣa pratyayasargo viparyayāśaktituṣṭisiddhyākhyaḥ । guṇavaiṣamyavimardāt tasya ca bhedāstu pañcāśat ॥ 46॥
एषह् प्रत्ययसर्ग [eṣah pratyayasarga] esta é a criação da buddhi* आख्य विपर्यय [ākhya viparyaya] suas características distintivas são o falso conhecimento (viparyaya)* अशक्ति [aśakti] incapacidade (aśakti)* तुष्टि [tuṣṭi] satisfação (tuṣṭi)* सिद्धि [siddhi] e sucesso ou perfeição (siddhi)* च तु तस्य पाञ्चाशत् भेद [ca tu tasya pāñcāśat bheda] destes surgem cinquenta impedimentos diferentes ao conhecimento verdadeiro* वैषम्य विमर्द गुण [vaiṣamya vimarda guṇa] e todas essas diferenças são devidas aos conflitos dos três guṇas*
46- Esta é a criação da Buddhi, suas características distintivas são o falso conhecimento (Viparyaya), incapacidade (Aśakti), satisfação (Tuṣṭi) e sucesso ou perfeição (Siddhi); destes surgem cinquenta impedimentos diferentes ao conhecimento verdadeiro; e todas essas diferenças são devidas aos conflitos dos três Guṇas.
Gauḍapāda: A criação do intelecto é dividida em quatro classes: ignorância, incapacidade, satisfação e realização. Ignorância é a dúvida, como quando uma pessoa, depois de ver um poste, está em dúvida se é um poste ou uma pessoa. Incapacidade é quando, depois de observar o poste de perto, uma pessoa não pode remover sua dúvida. Com satisfação, uma pessoa não quer saber nem estar em dúvida sobre o mesmo poste, pensando: "O que isso tem a ver comigo?" A realização é quando uma pessoa com sentidos perfeitos vê o poste encimado por uma trepadeira ou um pássaro, ele sabe, ou alcança o conhecimento, que é um poste.
Assim, devido ao conflito entre as desigualdades dos guṇas, existem cinquenta variedades daquela criação do intelecto. Em algum lugar, sattva é predominante e rajas e tamas são subordinados; em algum lugar rajas predomina; e em algum lugar tamas.
47- पञ्च विपर्ययभेदा भवन्त्यशक्तेश्च करणवैकल्यात् । अष्टाविंशतिभेदास्तुष्टिर्नवधाष्टधा सिद्धिः ॥ ४७॥
pañca viparyayabhedā bhavantyaśakteśca karaṇavaikalyāt । aṣṭāviṃśatibhedāstuṣṭirnavadhāṣṭadhā siddhiḥ ॥ 47॥
पञ्च भवङ्ति भेद विपर्यय [pañca bhavaṅti bheda viparyaya] cinco são as variedades do falso conhecimento* अष्टाविम्शाति भेद अशक्ति च करण वैकल्यात् [aṣṭāvimśāti bheda aśakti ca karaṇa vaikalyāt] e vinte e oito de incapacidade decorrente do comprometimento dos órgãos* तुष्टि नवधा [tuṣṭi navadhā] satisfação (a complacência da mente) é de nove tipos* सिद्धि अष्टधा [siddhi aṣṭadhā] enquanto o verdadeiro conhecimento é óctuplo*
47- Cinco são as variedades do falso conhecimento e, vinte e oito de incapacidade decorrente do comprometimento dos órgãos; A complacência da mente é de nove tipos; enquanto o verdadeiro conhecimento é óctuplo.
Gauḍapāda: As cinco variedades de ignorância são: tamas (escuridão), moha (ilusão), mahāmoha (ilusão extrema) tāmisra (obscuridade) e andkatāmisra (escuridão total). As incapacidades são devidas a defeitos nos órgãos. A complacência é caracterizada por rajas e a realização é caracterizada por sattva.
48- भेदस्तमसोऽष्टविधो मोहस्य च दशविधो महामोहः । तामिस्रोऽष्टादशधा तथा भवत्यन्धतामिस्रः ॥ ४८॥
bhedastamaso'ṣṭavidho mohasya ca daśavidho mahāmohaḥ । tāmisro'ṣṭādaśadhā tathā bhavatyandhatāmisraḥ ॥ 48॥
भेद तमस् च मोह अष्टविध [bheda tamas ca moha aṣṭavidha] as variedades de escuridão e ilusão são oito* मह मोह दशविध [maha moha daśavidha] ilusão extrema é de dez tipos* तामिस्र तथा अङ्धतामिस्र भवति अष्टादशधा [tāmisra tathā aṅdhatāmisra bhavati aṣṭādaśadhā] turvação e total escuridão são de dezoito tipos*
48- As variedades de escuridão (tamas) e ilusão (moha) são oito; ilusão extrema (maha moha) é de dez tipos; obscuridade (tāmisra) e total escuridão (aṅdhatāmisra) são de dezoito tipos.
Gauḍapāda: A escuridão (ignorância) é de oito tipos. A dissolução final é diferenciada pela ignorância. Uma pessoa se funde nos oito envolventes: Prakṛti, intelecto, ahaṃkara e os cinco elementos sutis. Quando uma pessoa é ligada a uma delas e pensa: "Sou livre", isso é considerado uma variedade de obscuridade.
49- एकादशेन्द्रियवधाः सह बुद्धिवधैरशक्तिरुद्दिष्टा । सप्तदश वधा बुद्धेर्विपर्ययात् तुष्टिसिद्धीनाम् ॥ ४९॥
ekādaśendriyavadhāḥ saha buddhivadhairaśaktiruddiṣṭā । saptadaśa vadhā buddherviparyayāt tuṣṭisiddhīnām ॥ 49॥
वध एकादश इङ्द्रिय [vadha ekādaśa iṅdriya] as injurias dos onze órgãos* सह वध बुद्धिअ [saha vadha buddhi] junto com as injúrias da buddhi* उद्दिष्टा अशक्ति [uddiṣṭā aśakti] são consideradas as deficiências* वध बुद्धि सप्तदश [vadha buddhi saptadaśa] as injurias do intelecto são dezessete* विपर्यय तुष्टि सिद्धीनाम् [viparyaya tuṣṭi siddhīnām] e resultam da inversão da satisfação e da realização*
49- As injúrias dos onze órgãos junto com as do intelecto são consideradas deficiências. As injurias do intelecto são dezessete e resultam da inversão da satisfação e da realização.
Gauḍapāda: As injúrias dos onze órgãos são: surdez, cegueira, paralisia, perda do paladar, perda do olfato, mudez, mutilação do braço, claudicação, constipação, impotência e insanidade.
As carências das formas de satisfação são nove e as de realização são oito, totalizando dezessete. Estes serão explicados detalhadamente.
50- आध्यात्मिकाश्चतस्रः प्रकृत्युपादानकालभाग्याख्याः । बाह्या विषयोपरमाच्च पञ्च नव तुष्टयोऽभिमताः ॥ ५०॥ādhyātmikāścatasraḥ prakṛtyupādānakālabhāgyākhyāḥ । bāhyā viṣayoparamācca pañca nava tuṣṭayo'bhimatāḥ ॥ 50॥
नव अभिमत तुष्टि [nava abhimata tuṣṭi] tuṣṭi (contentamento) é de nove tipos* चतुर् आध्यात्मिक [catur ādhyātmika] quatro internos* आख्य प्रकृति उपादान काल भाग्य [ākhya prakṛti upādāna kāla bhāgya] conhecidos como prakrti (natureza), upādāna (meios), kāla (tempo) e bhāgya (sorte)* पञ्च बाह्य उपरम विषय [pañca bāhya uparama viṣaya] e cinco externos: aqueles devidos à rejeição dos objetos (dos sentidos)*
50- Tuṣṭi (contentamento) é de nove tipos: quatro internos: prakrti (natureza), upādāna (meios), kāla (tempo) e bhāgya (sorte); e cinco externos: aqueles devidos à rejeição dos objetos dos sentidos.
Gauḍapāda: Adhyātma significa residir no Self. Existem quatro tipos de contentamento interno: Prakṛti, os meios, o tempo e a sorte. Prakṛti é quando uma pessoa conhece a Prakṛti e seus atributos e permanece satisfeita com o conhecimento da Prakṛti e seus efeitos e desdobramentos e, portanto, não busca e não pode alcançar a liberação.Os meios referem-se a uma pessoa que não entende os vinte e cinco princípios, mas toma posse dos instrumentos de ascetismo e pensa que a salvação será alcançada andando em grupo, implorando com uma tigela e vestindo o hábito da moda. Ninguém pode obter libertação dessa maneira.
O tempo é quando uma pessoa pensa: "Eu vou conseguir a salvação no momento certo, então qual é a utilidade da prática?" Da mesma forma, o acaso é quando uma pessoa pensa que a salvação será alcançada pela sorte e não pelo esforço.
O contentamento externo surge da aversão aos cinco objetos dos sentidos. Uma pessoa sente aversão ao som, toque, forma, gosto e cheiro, vendo que estes podem ser acompanhados pelos males de aquisição, proteção, desperdício, fixação e injuria. Para nossa prosperidade, devemos pastar o gado, nos envolver no comércio e aceitar, dar e nos engajar nos serviços. Estes são os problemas de aquisição. Depois, há o problema de proteger os objetos adquiridos. Além disso, as coisas são desperdiçadas pelo prazer, causando um novo ciclo de aquisição. Os sentidos nunca cessam de se apegar aos prazeres sensuais, mas nunca há gozo sem causar dano a outros seres vivos. Assim, a aversão aos cinco objetos dos sentidos, que resulta de ver os males da aquisição e do resto, é um contentamento externo quíntuplo. A inversão desses tipos de contentamento constitui as diversas incapacidades.
51- ऊहः शब्दोऽध्ययनं दुःखविघातास्त्रयः सुहृत्प्राप्तिः । दानं च सिद्धयोऽष्टौ सिद्धेः पूर्वोऽङ्कुशस्त्रिविधः ॥ ५१॥
ūhaḥ śabdo'dhyayanaṃ duḥkhavighātāstrayaḥ suhṛtprāptiḥ । dānaṃ ca siddhayo'ṣṭau siddheḥ pūrvo'ṅkuśastrividhaḥ ॥ 51॥
अष्ट सिद्धि [aṣṭa siddhi] as oito realizações (obtenção do conhecimento)* ऊह शब्द अध्ययन त्रय दुह्खविघात सुकृतप्राप्ति च दान [ūha śabda adhyayana traya duhkhavighāta sukṛtaprāpti ca dāna] são o raciocínio a instrução verbal o estudo a supressão da tríplice miséria discussão amigável e a caridade.* त्रिविध पूर्व सिद्धि अङ्कुश [trividha pūrva siddhi aṅkuśa] os três tipos mencionados antes (viparyaya, aśakti e tuṣṭi) são obstáculos para a obtenção da realização*
51- As oito realizações são o raciocínio, a instrução verbal, o estudo, a supressão da tríplice miséria, discussão amigável, e a caridade. Aqueles mencionados antes Viparyaya, Aśakti e Tuṣṭi (ignorância, incapacidade e contentamento) são obstáculos para a obtenção da realização.
Gauḍapāda: O raciocínio examina o que é a verdade; o que é o futuro; qual é o Bem maior; Que ações me ajudam a alcançar meu objetivo? Enquanto pondera assim, alcança-se o conhecimento de que o Puruṣa é bem distinto da Prakṛti; o intelecto (Buddhi) é bastante distinto; o ego (ahaṃkara) é bem distinto; e da mesma forma os elementos sutis, órgãos e elementos densos são bem diferentes. Do conhecimento dos princípios a liberdade é alcançada. Esta é a primeira conquista do raciocínio.
Do conhecimento obtido pela instrução oral procede o conhecimento sobre a Prakṛti, o Puruṣa, o intelecto, o ego, os elementos sutis, os órgãos e os cinco elementos grosseiros. Deste conhecimento a salvação é alcançada. Essa é a conquista conhecida como instrução oral.
Do estudo das escrituras, obtém-se o conhecimento dos vinte e cinco princípios e depois da salvação. Esta é a terceira realização.
A tríplice supressão da miséria está relacionada com as influências internas, externas e divinas mencionadas anteriormente. Depois de receber instruções de um mestre, uma pessoa pode obter a salvação. Isso constitui a quarta até a sexta conquista.
A sétima conquista ocorre quando uma pessoa alcança a salvação através do conhecimento recebido de um amigo.
O oitavo é quando são dados apresentes a pessoas santas, fazendo com que elas retribuam com o conhecimento que leva à salvação.
A incapacidade do intelecto surge da ausência de uma dessas realizações. E aqueles mencionados antes, ignorância, incapacidade e contentamento, são o triplo freio da realização. A realização deve ser buscada porque uma pessoa realizada tem o conhecimento que leva à liberação...
52- न विना भावैर्लिङ्गं न विना लिङ्गेन भावनिर्वृत्तिः । लिङ्गाख्यो भावाख्यस्तस्माद् द्विविधाः प्रवर्तते सर्गः ॥ ५२॥
na vinā bhāvairliṅgaṃ na vinā liṅgena bhāvanirvṛttiḥ । liṅgākhyo bhāvākhyastasmād dvividhāḥ pravartate sargaḥ ॥ 52॥
न लिङ्ग विना भाव [na liṅga vinā bhāva] não pode haver liṅga (corpo sutil) sem as disposições (bhāvas)* न भावनिर्वृत्ति विना लिङ्ग [na bhāvanirvṛtti vinā liṅga] nem elaboração de disposições sem liṅga* तस्मात् प्रवर्तते द्वेधा सर्ग लिङ्गाख्य भावाख्य [tasmāt pravartate dvedhā sarga liṅgākhya bhāvākhya] portanto procede a dupla criação a do liṅga e a dos bhāvas (disposições)*
52- Não pode haver liṅga (corpo sutil) sem as disposições (bhāvas), nem elaboração de disposições sem liṅga. Portanto, procede a dupla criação: a do liṅga e a dos bhāvas (disposições).
Gauḍapāda: Como todo corpo (subsequente) é adquirido pelas impressões das ações realizadas nos nascimentos anteriores, não pode haver liṅga, corpo sutil, sem disposições no intelecto. Além disso, não pode haver elaboração de disposições, virtude e o resto sem liṅga.
A dependência mútua do intelecto e do corpo sutil, como o da semente e do broto, não é uma falha, porque a criação é sem princípio. Portanto, a criação dupla procede, ou seja, a do liṅga e a das disposições.
53- अष्टविकल्पो दैवस्तइर्यग्योनश्च पञ्चधा भवति । मानुष्यश्चैकविधः समासतो भौतिकः सर्गः ॥ ५३॥
aṣṭavikalpo daivastairyagyonaśca pañcadhā bhavati । mānuṣyaścaikavidhaḥ samāsato bhautikaḥ sargaḥ ॥ 53॥
दैवअष्ट विकल्प [daiva aṣṭa vikalpa] o divino tem oito variedades* च तैर्यग्योन भवति पञ्चधा [ca tairyagyona bhavati pañcadhā] o sub-humano tem cinco* च मानुष्य एकविध [ca mānuṣya ekavidha] e o humano tem apenas uma* समासतस् भौतिक सर्ग [samāsatas bhautika sarga] isto é o resumo da criação*
53- O divino tem oito variedades, o sub-humano tem cinco e o humano tem apenas uma. Isto é o resumo da criação.
Gauḍapāda: O divino é de oito variedades: brahmā e o resto. A criação sub-humana é de cinco tipos. O tipo humano é único. Estas são as catorze formas de criaturas.
54- ऊर्ध्वं सत्त्वविशालस्तमोविशालश्च मूलतः सर्गः । मध्ये रजोविशालो ब्रह्मादि स्तम्बपर्यन्तः ॥ ५४॥
ūrdhvaṃ sattvaviśālastamoviśālaśca mūlataḥ sargaḥ । madhye rajoviśālo brahmādi stambaparyantaḥ ॥ 54॥
ऊर्ध्व विशाल सत्त्व [ūrdhva viśāla sattva] acima há predominância de sattva* च मूल सर्ग विशाल तमस् [ca mūla sarga viśāla tamas] abaixo, prevalece tamas* मध्ये विशाल रजस् [madhye viśāla rajas] no meio predomina rajas* ब्रह्म आदि पर्यन्त स्तम्ब [brahma ādi paryanta stamba] (esta é a criação) de brahma até à folha de grama*
54- Acima há predominância de sattva; abaixo, prevalece tamas; no meio predomina rajas; esta é a criação de Brahma até à folha de grama.
Gauḍapāda: Acima, nas oito regiões celestiais, predomina sattva. Rajas e tamas também residem lá. Abaixo do reino humano, há excesso de tamas. De animais a seres imóveis toda a criação é permeada por um excesso de tamas; é claro que, mesmo lá, sattva e rajas estão presentes. No meio está a criação humana, onde rajas prevalece, embora sattva e tamas estejam presentes. Dominados por rajas, os seres humanos, em grande parte, são afetados pela paixão e pelo sofrimento.
Sāṁkhya kārikā de Iśvarakṛṣṇa com comentários de Gaudapādā [ 55 - 72]
55- तत्र जरामरणकृतं दुःखं प्राप्नोति चेतनः पुरुषः । लिङ्गस्याविनिवृत्तेस्तस्माद् दुःखं स्वभावेन ॥ ५५॥
tatra jarāmaraṇakṛtaṃ duḥkhaṃ prāpnoti cetanaḥ puruṣaḥ । liṅgasyāvinivṛttestasmād duḥkhaṃ svabhāvena ॥ 55॥
तत्र पुरुष चेतन प्राप्नोति [tatra puruṣa cetana prāpnoti] lá (nos três mundos) o puruṣa consciente experimenta* दुःख कृत जरामरण [duḥkha kṛta jarāmaraṇa] a dor devido à velhice e morte* अविनिवृत्ति लिङ्गस्य [avinivṛtti liṅgasya] até a cessação do linga* तस्मात् दुःख स्वभाव [tasmāt duḥkha svabhāva] daí o sofrimento é inerente à vida*
55- Então, o Puruṣa consciente experimenta a dor devido à velhice e morte até a cessação do linga; daí o sofrimento é inerente à vida.
Gauḍapāda: Nos estágios da vida, humana, subumana e divina, a miséria do corpo produzida pela velhice e pela morte é experimentada pelo Puruṣa consciente e não pela Prakṛti, ou pelo intelecto, ou ahaṃkara, ou elementos sutis, ou órgãos, ou elementos grosseiros.
O Puruṣa sofre até a cessação do linga (corpo sutil). Até que mahat e o resto, que se manifestam após, cessarem. A cessação do linga significa que o corpo sutil deixa de existir. Após a cessação do corpo sutil, há liberação; e após a obtenção da liberdade, não há miséria.
Como o corpo sutil é removido? É removido pela obtenção do conhecimento dos vinte e quatro princípios produzidos pela Prakṛti como distintos do Puruṣa. Por tal conhecimento, percebemos que: isto é a Prakṛti, isto é o intelecto, isto é ahaṃkara, e estes são os cinco elementos densos diferentes e distintos do Puruṣa. Então o corpo sutil deixa de existir e então a liberação é alcançada.
56- इत्येष प्रकृतिकृतो महदादिविशेषभूतपर्यन्तः । प्रतिपुरुषविमोक्षार्थं स्वार्थैव परार्थारम्भः ॥ ५६॥
ityeṣa prakṛtikṛto mahadādiviśeṣabhūtaparyantaḥ । pratipuruṣavimokṣārthaṃ svārthaiva parārthārambhaḥ ॥ 56॥
इत्येष प्रकृति कृत [ityeṣa prakṛti kṛta] assim a atividade da prakṛti* महत् आदि पर्यन्त विशेष भूत [mahat ādi paryanta viśeṣa bhūta] começando do mahat até os elementos densos* विमोक्ष अर्थ प्रति पुरुष [vimokṣa artha prati puruṣa] é para a liberação de cada puruṣa* स्वार्थ इव परार्थ आरम्भ [svārtha iva parārtha ārambha] embora seja para benefício de outrem parece que é para si mesma*
56- Assim, a atividade da Prakṛti, começando do mahat até os elementos densos, é para a liberação de cada Puruṣa; embora seja para benefício de outrem, parece que é para si mesma.
Gauḍapāda: A expressão Ityeṣaḥ (iti eṣa) significa terminar e apontar. Prakrtikrta é a instrumentalidade ou a atividade da Prakṛti. Este esforço que começa de mahat até os elementos densos é para a libertação de cada Puruṣa, que assume forma divina, sub-humana ou humana.
Embora esse esforço seja para benefício do Puruṣa, ainda assim parece que foi para Prakṛti. A Prakṛti se comporta como um homem que abandona seu próprio negócio e realiza o de seu amigo. O Puruṣa não faz nada em retribuição à Prakṛti. O benefício da atividade da Prakṛti é a aquisição dos objetos dos sentidos como o som e o resto, e a compreensão da distinção entre Buddhi e Puruṣa.
Pode-se argumentar que se a Prakṛti não é inteligente e o Puruṣa é inteligente, então como a Prakṛti pode agir como um princípio inteligente, pensando: “Eu deveria suprir o Puruṣa com os objetos dos sentidos como o som e o resto em todos os três mundos para que Puruṣa atinja a liberação final?” A resposta é que porque a atividade e a cessação da atividade podem ser observadas no caso de coisas não-inteligentes, assim Prakṛti age.
57- वत्सविवृद्धिनिमित्तं क्षीरस्य यथा प्रवृत्तिरज्ञस्य । पुरुषविमोक्षनिमित्तं तथा प्रवृत्तिः प्रधानस्य ॥ ५७॥
vatsavivṛddhinimittaṃ kṣīrasya yathā pravṛttirajñasya । puruṣavimokṣanimittaṃ tathā pravṛttiḥ pradhānasya ॥ 57॥
यथा अज्ञ क्षीर प्रवृत्ति [yathā ajña kṣīra pravṛtti] como o leite não inteligente funciona* निमित्त विवृद्धि वत्स [nimitta vivṛddhi vatsa] para a nutrição do bezerro* तथा प्रधान प्रवृत्ति [tathā pradhāna pravṛtti] a prakṛti também funciona* निमित्त विमोक्ष पुरुष [nimitta vimokṣa puruṣa] para a liberação do puruṣa*
57- Como o leite não inteligente funciona para a nutrição do bezerro, a Prakṛti também funciona para a liberação do Puruṣa.
Gauḍapāda: Assim como a grama e semelhantes são consumidos por uma vaca e modificados como leite que nutre o bezerro, e cessa, quando ele se tornar (suficientemente) forte, assim Prakṛti também funciona para a liberação do Puruṣa. Assim, há atividade na Prakṛti não inteligente.
58- औत्सुक्यनिवृत्त्यर्थं यथा क्रियासु प्रवर्तते लोकः । पुरुषस्य विमोक्षार्थं प्रवर्तते तद्वदव्यक्तम् ॥ ५८॥
autsukyanivṛttyarthaṃ yathā kriyāsu pravartate lokaḥ । puruṣasya vimokṣārthaṃ pravartate tadvadavyaktam ॥ 58॥
यथा लोक प्रवर्तते क्रिय [yathā loka pravartate kriya] assim como as pessoas se envolvem em ações* निवृत्ति अर्थ औत्सुक्य [nivṛtti artha autsukya] para satisfazer seus desejos* तद्वत् प्रवर्तते अव्यक्त [tadvat pravartate avyakta] também o não-manifesto age* विमोक्ष अर्थ पुरुष [vimokṣa artha puruṣa] para liberar o puruṣa*
58- Assim como as pessoas se envolvem em ações para satisfazer seus desejos, também o não-manifesto age para liberar o Puruṣa.
Gauḍapāda: Como as pessoas com desejo se envolvem em ações para realizar seu anseio, e também após a realização, esforçam-se para cessar essa atividade, a Prakṛti deixa de funcionar depois de ter servido ao propósito do Puruṣa, que é duplo. Um dos propósitos é o desfruto dos objetos dos sentidos como o som e o resto; e o outro é a obtenção do conhecimento da distinção entre Prakṛti e Puruṣa.
59- रङ्गस्य दर्शयित्वा निवर्तते नर्तकी यथा नृत्यात् । पुरुषस्य तथात्मानं प्रकाश्य विनिवर्तते प्रकृतिः ॥ ५९॥
raṅgasya darśayitvā nivartate nartakī yathā nṛtyāt । puruṣasya tathātmānaṃ prakāśya vinivartate prakṛtiḥ ॥ 59॥
यथा नर्तकी [yathā nartakī] como uma dançarina* नृत्य निवर्तते [nṛtya nivartate] encerra a dança* रङ्ग दर्शयित्वा [raṅga darśayitvā] depois de se mostrar para a platéia* तथा प्रकृति विनिवर्तते [tathā prakṛti vinivartate] também a prakṛti desiste de atuar* प्रकाश्य आत्मानम् पुरुष [prakāśya ātmānam puruṣa] depois de se mostrar ao Puruṣa*
59- Como uma dançarina encerra a dança depois de se mostrar para a platéia, também, a Prakṛti desiste de atuar depois de se mostrar ao Puruṣa.
Gauḍapāda: Como uma dançarina, tendo exibido para o público os episódios que são musicados em forma de canções, e que estão cheios de sentimentos de amor e afins, por meio de seus movimentos graciosos, desiste de dançar depois de cumprir seu dever, assim também a Prakṛti, tendo-se exibido ao Puruṣa nos diferentes tattvas, intelecto, ahaṃkara, elementos sutis e elementos densos, também, deixa de atuar.
60- नानाविधैरुपायैरुपकारिण्यनुपकारिणः पुंसः । गुणवत्यगुणस्य सतस्तस्यार्थमपार्थकं चरति ॥ ६०॥
nānāvidhairupāyairupakāriṇyanupakāriṇaḥ puṃsaḥ । guṇavatyaguṇasya satastasyārthamapārthakaṃ carati ॥ 60॥
उपकारिन् गुणवत् [upakārin guṇavat] a benevolente prakṛti dotada dos guṇas* अपार्थक चरति ननविध उपाय [apārthaka carati nanavidha upāya] sem qualquer benefício para si mesma concede por múltiplos meios* सतस् तस्य अर्थ पुंस् [satas tasya artha puṃs] benefícios para o puruṣa* अगुण अनुपकारिन् [aguṇa anupakārin] que é desprovido dos guṇas e não requer nenhum benefício em troca*
60- A benevolente Prakṛti, dotada dos guṇas, sem qualquer benefício para si mesma, concede por múltiplos meios benefícios para o Puruṣa que é desprovido dos guṇas, e não requer nenhum benefício em troca.
Gauḍapāda: Transformando-se em formas divinas, subumanas e humanas; transformando-se em prazer, dor e ilusão; e transformando-se nos objetos dos sentidos em forma de som e o resto, a Prakṛti beneficia o Puruṣa. Deste modo, tendo-se exibido ao Puruṣa, a Prakṛti encerra sua atuação. Assim, beneficia o Puruṣa eterno sem qualquer benefício para si mesma. Assim como uma pessoa generosa dá a todos e não deseja nada de bom em troca, a Prakṛti, também, realiza o propósito do Puruṣa sem nada em troca.
61- प्रकृतेः सुकुमारतरं न किञ्चिदस्तीति मे मतिर्भवति । या दृष्टास्मीति पुनर्न दर्शनमुपैति पुरुषस्य ॥ ६१॥
prakṛteḥ sukumārataraṃ na kiñcidastīti me matirbhavati । yā dṛṣṭāsmīti punarna darśanamupaiti puruṣasya ॥ 61॥
इति मे मति भवति [iti me mati bhavati] na minha opinião* न अस्ति किञ्चित् सुकुमारतर प्रकृति [na asti kiñcit sukumāratara prakṛti] nada é mais despretensioso do que prakṛti* या दृष्टा अस्मि इति [yā dṛṣṭā asmi iti] pecebendo que 'eu fui vista'* पुनर् न उपैति दर्शन पुरुष [punar na upaiti darśana puruṣa] nunca mais se expõe à visão do puruṣa*
61- Na minha opinião, nada é mais despretensioso do que Prakṛti: percebendo que 'eu fui vista', nunca mais se expõe à visão do Puruṣa.
Gauḍapāda: Neste mundo nada é mais despretensioso que Prakṛti. Por quê? Porque uma vez que é vista pelo Puruṣa, a Prakṛti nunca mais se expõe à visão do Puruṣa. Em vez disso, torna-se invisível para o Puruṣa. A pergunta então vem: "Por que a vida se manifestaria?"
Alguns defendem que Īsvara seja a causa; outros defendem a espontaneidade como a causa. O Samkhya questiona como os seres dotados dos guṇas podem ser criados por Deus que é imputável, ou até mesmo pelo Puruṣa sem guṇas. Portanto, a causalidade da Prakṛti é adequada. Assim como a partir de fios brancos, apenas tecido branco é produzido e de fios pretos, apenas tecidos pretos, infere-se que os três mundos dotados dos três guṇas procedem da Prakṛti dotada de três guṇas. Īsvara não tem atributos. Portanto, é ilógico pensar que Deus produz este mundo dotado dos três guṇas. Isso explica também a impossibilidade de o Puruṣa ser considerado a causa.
Alguns consideram o tempo como a causa. Responde o Sāmkhya, existem apenas três categorias: o manifesto, o não-manifesto e o Conhecedor. O tempo também está incluído em um deles. O tempo é manifesto. E como a Prakṛti é a produtora de tudo, também deve ser a causa do tempo. A espontaneidade também está incluída lá. Portanto, nem a espontaneidade nem o tempo são a causa; e só a Prakṛti é a causa e não há outra causa da Prakṛti.
Portanto, na minha opinião, não há outra causa como Īsvara e o resto. E se for dito que o Puruṣa é liberado ou o Puruṣa migra, a isto o autor responde:
62- तस्मान् न बध्यतेऽद्धा न मुच्यते नापि संसरति कश्चित् । संसरति बध्यते मुच्यते च नानाश्रया प्रकृतिः ॥ ६२॥
tasmān na badhyate'ddhā na mucyate nāpi saṃsarati kaścit । saṃsarati badhyate mucyate ca nānāśrayā prakṛtiḥ ॥ 62॥
तस्मात् न बध्यते [tasmāt na badhyate] portanto nenhum Puruṣa está encadeado* अद्धा न मुच्यते [addhā na mucyate] ou liberado* न अपि संसर कश्चित् [na api saṃsara kaścit] nem transmigra* नानाश्रया प्रकृति [nānāśrayā prakṛti] é a Prakṛti que assume múltiplas formas* संसर बध्यते मुच्यते च [saṃsara badhyate mucyate ca] que transmigra ou é acorrentada ou libertada*
62- Portanto, nenhum Puruṣa está encadeado ou liberado, nem transmigra. É a Prakṛti, que assume múltiplas formas, que transmigra ou é acorrentada ou libertada.
Gauḍapāda: Por essa razão, o Puruṣa não é encadeado ou liberado, nem transmigra. Somente a Prakṛti que assume múltiplas formas, é encarcerada ou liberada ou transmigra nas formas do intelecto, ahaṃkara, dos elementos sutis, dos órgãos e elementos densos.
Se o Puruṣa é espontaneamente liberado e é todo-penetrante, então por que ele migra? A migração é para o propósito de adquirir aquilo que não é previamente alcançado. As frases “Puruṣa está ligado”, “Puruṣa é liberado” ou “Puruṣa migra” são usadas porque a transmigração não é bem entendida. Ao discriminar entre Puruṣa e Prakṛti, o caráter real do Puruṣa é manifestado.
Se o Puruṣa não está encadeado, então nunca é liberado. Só a Prakṛti se liga ou se libera. Quando o corpo sutil dota um corpo denso com os elementos sutis e os órgãos internos tríplices, esse corpo é limitado pela escravidão tripla. Como já foi dito, “Aquele que está preso pelas amarras naturais e pessoais não é liberado por qualquer outra coisa que não seja o conhecimento”. E, esse corpo sutil é dotado de virtude e vício.
63- रूपैः सप्तभिरेव तु बध्नात्यात्मानमात्मना प्रकृतिः । सैव च पुरुषार्थं प्रति विमोचयत्येकरूपेण ॥ ६३॥
rūpaiḥ saptabhireva tu badhnātyātmānamātmanā prakṛtiḥ । saiva ca puruṣārthaṃ prati vimocayatyekarūpeṇa ॥ 63॥
प्रकृति बध्नाति तु एव आत्मान् सप्त रूप [prakṛti badhnāti tu eva ātmān sapta rūpa] a prakṛti liga-se pelas sete formas* च आत्मना सैव विमोचयति एक रूपेण [ca ātmanā saiva vimocayati eka rūpeṇa] e ela mesma se libera através de uma forma* पुरुष अर्थ प्रति [puruṣa artha prati] para o benefício do puruṣa*
63- A Prakṛti liga-se pelas sete formas e ela mesma se libera através de uma forma, para o benefício do Puruṣa.
Gauḍapāda: A Prakṛti se liga através de sete formas: virtude, não-apego, poder, vício, ignorância, apego e ausência de poder. Através destas a Prakṛti liga-se por si só. A mesma Prakṛti, atuando com o propósito do Puruṣa, se liberta através de uma forma - conhecimento
64- एवं तत्त्वाभ्यासान् नास्मि न मे नाहमित्यपरिशेषम् । अविपर्ययाद् विशुद्धं केवलमुत्पद्यते ज्ञानम् ॥ ६४॥
evaṃ tattvābhyāsān nāsmi na me nāhamityapariśeṣam । aviparyayād viśuddhaṃ kevalamutpadyate jñānam ॥ 64॥
तत्त्व अभ्यास एवम् [tattva abhyāsa evam] praticando os princípios assim* ज्ञान उत्पद्यते [jñāna utpadyate] surge o conhecimento (Jñāna)* न अस्मि [na asmi] não existo* न मे [na me] nada é meu* न अहम् [na aham] não sou* इति अपरिशेष अविपर्ययात् विशुद्ध केवल [iti apariśeṣa aviparyayāt viśuddha kevala] que é completo inequívoco puro e absoluto*
64- Praticando os princípios assim, surge o conhecimento (jñāna): "não existo, nada é meu, não sou", que é completo, inequivoco, puro e absoluto.
Gauḍapāda: Do modo descrito acima, praticamos a meditação sobre os vinte e cinco princípios - “Isto é Prakṛti, isto é Puruṣa, estes são os cinco elementos sutis, os órgãos e os elementos densos”. Através da prática, surge este conhecimento no Puruṣa — “Eu não existo, nada é meu, eu não sou” Este corpo não é meu, pois eu sou uma coisa e o corpo outro. Eu estou acima do ego; é o conhecimento completo.
Não resta dúvida que este conhecimento é puro e absoluto. Somente este conhecimento puro é a causa da salvação e não outro. Resulta do conhecimento dos vinte e cinco princípios.
65- तेन निवृत्तप्रसवामर्थवशात् सप्तरूपविनिवृत्ताम् । प्रकृतिं पश्यति पुरुषः प्रेक्षकवदवस्थितः सुस्थः ॥ ६५॥
tena nivṛttaprasavāmarthavaśāt saptarūpavinivṛttām । prakṛtiṃ paśyati puruṣaḥ prekṣakavadavasthitaḥ susthaḥ ॥ 65॥
तेन [tena] por este conhecimento (tattvas)* पुरुष सुस्थ प्रेक्षकवत् पश्यति प्रकृति [puruṣa sustha prekṣakavat paśyati prakṛti] o puruṣa contido percebe como um espectador a prakṛti* निवृत्ति प्रशवा [nivṛtti praśavā] que deixou de ser produtiva* विनिवृत्त सप्त रूप अवस्थित अर्थवश [vinivṛtta sapta rūpa avasthita arthavaśa] e retorna das sete formas pois cumpriu os propósitos (do puruṣa)*
65- Por este conhecimento (tattvas), o Puruṣa contido percebe como um espectador a Prakṛti, que deixou de ser produtiva e retorna das sete formas pois cumpriu os propósitos do Puruṣa.
Gauḍapāda: Com o conhecimento puro e absoluto, o Puruṣa percebe a Prakṛti como um espectador sentado e contido. Como um espectador quieto de uma peça percebe uma atriz de seu próprio assento confortável.
Nesse ponto, a Prakṛti deixa de ser produtiva. Deixa de produzir os efeitos na forma de intelecto, ahaṃkara e o resto. Consequentemente, ela se reverte das sete formas porque cumpriu ambos os propósitos do Puruṣa, que são a experiência e a liberação. As sete formas de virtude e o resto, com as quais a Prakṛti se liga, são revertidas.
66- दृष्टा मयेत्युपेक्षकैको दृष्टाहमित्युपरतान्या । सति संयोगेऽपि तयोः प्रयोजनं नास्ति सर्गस्य ॥ ६६॥
dṛṣṭā mayetyupekṣakaiko dṛṣṭāhamityuparatānyā । sati saṃyoge'pi tayoḥ prayojanaṃ nāsti sargasya ॥ 66॥
एक दृष्टा अहम् इति [eka dṛṣṭā aham iti] um puruṣa diz "eu a vi" (entendo o que ela é)* इति उपेक्षक [iti upekṣaka] e assim torna-se indiferente* दृष्टा मया उपरत अन्या [dṛṣṭā mayā uparata anyā] (a prakṛti) alega como eu fui vista desisto (de mais motivações)* अपि सति संयोग तयोस् [api sati saṃyoga tayos] mesmo havendo conexão entre ambos* प्रयोजनं न अस्ति सर्गस्य [prayojanaṃ na asti sargasya] não há necessidade de criação adicional*
66- Um Puruṣa diz: "Eu a vi", e assim torna-se indiferente; a Prakṛti alega como "eu fui vista", desisto (de mais motivações); mesmo havendo conexão entre ambos, não há necessidade de criação adicional.
Gauḍapāda: Como um espectador em uma peça, o Puruṣa absoluto e puro é indiferente. A Prakṛti, não mais necessária para o Puruṣa, desiste. Embora o Puruṣa e a Prakṛti desistam assim, por causa da onipresença deles, há contato entre os dois, mas não há criação resultante do contato. Quando a criação serviu a ambos os propósitos, não há motivo para ela criar ainda mais. Como o contato entre um devedor e um credor é para o serviço de um empréstimo, após o pagamento da dívida, apesar do contato entre eles, não há transação monetária. Da mesma forma, o Puruṣa e a Prakṛti também não têm mais propósito para transação.
Alguém pode perguntar, se depois da conquista do conhecimento e de alcançar a salvação, por que minha vida continua?
67- सम्यग्ज्ञानाधिगमाद् धर्मादीनामकारणप्राप्तौ । तिष्ठति संस्कारवशाच्चक्रभ्रमवद् धृतशरीरः ॥ ६७॥
samyagjñānādhigamād dharmādīnāmakāraṇaprāptau । tiṣṭhati saṃskāravaśāccakrabhramavad dhṛtaśarīraḥ ॥ 67॥
सम्य ज्ञान अधिगम [samya jñāna adhigama] embora pela obtenção (do conhecimento dos tattvas)* धर्मादी [dharmādī] a virtude e o resto* अकारण प्राप्ति [akāraṇa prāpti] deixem de ser produtores* तिष्ठति [tiṣṭhati] ainda assim por causa das impressões passadas* धृतशरीर [dhṛtaśarīra] (o puruṣa permanece) investido de um corpo* चक्रभ्रमिवत् संस्कार वश [cakrabhramivat saṃskāra vaśa] como uma roda de oleiro, que continua girando (por inércia)*
67- Embora pela obtenção do conhecimento, a virtude e o resto deixem de ser produtores, ainda assim, por causa das impressões passadas, o Puruṣa permanece investido de um corpo como uma roda de oleiro, que continua girando (por inércia).
Gauḍapāda: Embora o perfeito conhecimento dos vinte e cinco princípios seja alcançado, ainda assim, por causa das impressões passadas, um yogin permanece dotado de um corpo. Como um oleiro põe em movimento sua roda para fazer um pote de barro, e, depois de fazer o pote abandona a roda, mas a roda continua girando por causa do impulso passado.
Assim, pela obtenção do conhecimento perfeito, a virtude e o resto deixam de ser produtores. Essas sete formas de escravidão são queimadas ou destruídas pelo conhecimento perfeito. Como as sementes queimadas pelo fogo não podem germinar, então essas formas de escravidão, virtude e o resto são incapazes de produzir servidão. Quando a virtude e o resto deixam de ser produtores, por causa das impressões passadas, o Puruṣa, ainda, permanece dotado de um corpo.
Virtude e vício existem, mas em um momento eles podem ser destruídos pelo conhecimento. O conhecimento destrói os efeitos de todas as ações futuras, bem como os efeitos dessas ações prescritas pelas Escrituras. Após o esgotamento das impressões anteriores, o corpo perece e a salvação resulta. De que natureza é essa salvação?
68- प्राप्ते शरीरभेदे चरितार्थत्वात् प्रधानविनिवृत्तौ । ऐकान्तिकमात्यन्तिकमुभयं कैवल्यमाप्नोति ॥ ६८॥
prāpte śarīrabhede caritārthatvāt pradhānavinivṛttau । aikāntikamātyantikamubhayaṃ kaivalyamāpnoti ॥ 68॥
प्राप्ते शरीरभेद [prāpte śarīrabheda] quando a separação do corpo for alcançada* चरित अर्थत्व [carita arthatva] ela consecusão do propósito* प्रधान विनिवृत्ति [pradhāna vinivṛtti] e após a cessação da prakṛti* प्राप्नोति कैवल्य [prāpnoti kaivalya] o puruṣa alcança Kaivalya* उभय ऐकाङ्तिक आत्यङ्तिक [ubhaya aikāṅtika ātyaṅtika] que é aboluto e definitivo*
68- Após obter a separação do corpo, pela consecusão do propósito e após a cessação da Prakṛti, o Puruṣa alcança Kaivalya que é aboluto e definitivo.
Gauḍapāda: Pela destruição de todos os impulsos gerados pela virtude e pelo resto, depois de obter a separação do corpo, e após a cessação da Prakṛti, o Puruṣa alcança o isolamento. Então, Kaivalya certo, absoluto e definitivo é alcançado. Há libertação devido ao isolamento e, é alcançado o definitivo Kaivalya.
69- पुरुषार्थज्ञानमिदं गुह्यं परमर्षिणा समाख्यातम् । स्थित्युत्पत्तिप्रलयाश्चिन्त्यन्ते यत्र भूतानाम् ॥ ६९॥
puruṣārthajñānamidaṃ guhyaṃ paramarṣiṇā samākhyātam । sthityutpattipralayāścintyante yatra bhūtānām ॥ 69॥
इदं गुह्य ज्ञान [idaṃ guhya jñāna] este insólito conhecimento* अर्थ पुरुष [artha puruṣa] dos objetivos do puruṣa* यतृअ चिन्त्यङ्ते स्थिति उत्पत्ति प्रलय भूतानाम् [yatṛa cintyaṅte sthiti utpatti pralaya bhūtānām] no qual são consideradas a existência a origem e a dissolução dos seres* समाख्यातम् परम र्षि [samākhyātam parama rṣi] foi exposto pelo grande sábio (kapila)*
69- Este insólito conhecimento dos objetivos do Puruṣa, no qual são consideradas a existência, a origem e a dissolução dos seres, foi exposto pelo grande sábio (Kapila).
Gauḍapāda: O objetivo do Puruṣa é a liberação. Para esse propósito, este extraordinário conhecimento foi exposto por Kapila. Da meditação sobre esse conhecimento surge o conhecimento perfeito sobre os vinte e cinco princípios. O Sāṃkhya, a ciência da libertação do Saṃsāra, foi exposto pelo sábio Kapila e o Bhasya por Gaudapada.
70- एतत् पवित्रमग्र्यं मुनिरासुरयेऽनुकम्पया प्रददौ । आसुरिरपि पञ्चशिखाय तेन बहुधाकृतं तन्त्रम् ॥ ७०॥
etat pavitramagryaṃ munirāsuraye'nukampayā pradadau । āsurirapi pañcaśikhāya tena bahudhākṛtaṃ tantram ॥ 70॥
एतद् पवित्र अग्र्य [etad pavitra agrya] esse (conhecimento) sagrado e supremo* मुनि अनुकंपा प्रददौ आसुरि [muni anukaṃpā pradadau āsuri] o sábio (kapila) transmitiu, por compaixão, a āsuri* आसुरि अपि पञ्चशिख [āsuri api pañcaśikha] āsuri (transmitiu) a pañcaśikha* तेन कृत बहुधा तन्त्र [tena kṛta bahudhā tantra] que elaborou detalhadamente a doutrina*
70- Esse conhecimento sagrado e supremo, o sábio Kapila transmitiu, por compaixão, a Āsuri. Āsuri transmitiu a Pañcaśikha que elaborou a doutrina.
71- शिष्यपरम्परयागतमीश्वरकृष्णेन चैतदार्याभिः । सङ्क्षिप्तमार्यमतिना सम्यग्विज्ञाय सिद्धान्तम् ॥ ७१॥
śiṣyaparamparayāgatamīśvarakṛṣṇena caitadāryābhiḥ । saṅkṣiptamāryamatinā samyagvijñāya siddhāntam ॥ 71॥
सिद्धान्त [siddhānta] esta doutrina (estabelecida por consenso)* शिष्य परंपर आगत [śiṣya paraṃpara āgata] transmitida por sucessão discipular* आर्यमति ईश्वरकृष्ण [āryamati īśvarakṛṣṇa] para a nobre mente de īśvara Kṛṣṇa* संयक् विज्ञा [saṃyak vijñā] tendo sido completamente entendida por ele* सङ्क्षिप् [saṅkṣip] foi resumida* च एतद् आर्याभि [ca etad āryābhi] e (apresentada) em versos com métrica arya*
71- Esta doutrina, transmitida por sucessão discipular para a nobre mente de Īśvara Kṛṣṇa, tendo sido completamente entendida por ele, foi resumida em versos com métrica Arya.
72- सप्तत्यां किल येऽर्थास्तेऽर्थाः कृत्स्नस्य सृष्टितन्त्रस्य । आख्यायिकाविरहिताः परवादविवर्जिताश्चाऽपि ॥ ७२॥
saptatyāṃ kila ye'rthāste'rthāḥ kṛtsnasya sṛṣṭitantrasya । ākhyāyikāvirahitāḥ paravādavivarjitāścā'pi ॥ 72॥
सप्तति किल ये अर्थ [saptati kila ye artha] o conteúdo desses setenta versos é tratado* कृत्स्न षष्टितन्त्र [kṛtsna ṣaṣṭitantra] completamente no ṣaṣṭitantra* ते अर्थ आख्यायिका विरहित [te artha ākhyāyikā virahita] excluindo detalhes inúteis* चा अपि परवाद विवर्जित [cā api paravāda vivarjita] e também omitindo controversias*
72- O conteúdo desses setenta versos é tratado completamente no Ṣaṣṭitantra; excluindo detalhes inúteis e e também omitindo controversias.
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