19/06/2020

Bhagavad Gita Introdução



॥ भगवद् गीता ॥ Bhagavad-Gītā  "O Cântico do Senhor"

        A Bhagavad Gita (भगवद् गीता, bhagavad-gītā) "O Cântico do Senhor", é uma escritura sagrada hindu que faz parte do épico Mahabharata (capítulos 23-40 do Bhishma Parva e contém 700 versos). A Gita é o fundamento do diálogo entre o príncipe Pandava Arjuna e seu guia e cocheiro Krishna, pouco antes do início da Guerra de Kurukshetra.
        No início do Dharma Yudhha (guerra justa) entre Pandavas e Kauravas, Arjuna se preocupa com a violência e as mortes que a guerra trará para seus próprios parentes e amigos. Desesperado, com o dilema moral de continuar ou renunciar, ele procura o conselho de Krishna, cujas respostas constituem a Bhagavad Gita.
        Krishna aconselha Arjuna a "cumprir seu dever de Kshatriya (guerreiro) defendendo o Dharma. Os diálogos entre Krishna e Arjuna cobrem uma ampla gama de questões espirituais, abordando temas éticos e questões filosóficas que vão muito além da guerra que Arjuna enfrenta; responde perguntas sobre "quem somos, como devemos viver nossas vidas e como devemos agir no mundo". Segundo Sargeant, ele investiga questões sobre o "objetivo da vida, crise de identidade própria, a psique humana, temperamento humano e formas de busca espiritual".
        Inúmeros comentários foram escritos sobre a Bhagavad Gita, com visões muito diferentes sobre sua essência. Os comentadores do Vedanta apresentam diversas interpretações das relações entre o Self e Brahman: O Advaita Vedanta (Vedanta Não Dualista) vê a identidade do Atman (Self) e Brahman, enquanto o Bhedabheda e o Vishishtadvaita vêem Atman e Brahman como diferentes e não diferentes. Entretanto O Dvaita Vedanta (Vedanta Dualista) considera o Atman (Self) e Brahman como princípios distintos.
        O cenário da Gita em um campo de batalha tem sido interpretado como uma metáfora para as lutas éticas e morais da vida humana. A Bhagavad Gita apresenta uma síntese das ideias hindus sobre Dharma, Bhakti e Moksha, também, aborda Jnana, Bhakti, Karma e Raja Yoga, incorporando ideias da filosofia Samkhya (capítulo 6).

Contexto da Gītā
        O Mahabharata conta a história épica do conflito entre duas famílias, os Pandavas e os Kauravas. A batalha foi travada entre os cem filhos do Kaurava Dhṛtarāṣṭra, chamados Dhārtarāṣṭras, e os cinco filhos de Pāṇḍu conhecidos como Pāṇḍavas.
        Quando Dhṛtarāṣṭra e Pāṇḍu, filhos de Vicitravīrya atingiram a maioridade, Bhīṣma, tendo renunciado ao trono, teve que entronizar um deles como governante. Embora Dhṛtarāṣṭra fosse mais velho que Pāṇḍu, não podia governar porque era cego. Pāṇḍu, portanto, tornou-se o governante e um grande conquistador, estendeu as fronteiras de seu reino e trouxe riqueza e prosperidade para o reino.
       Os Pāṇḍavas filhos de Pāṇdu são Yudhiṣṭhira, Arjuna, Bhīma, Nakula e Sahadeva. Entre os Kauravas, ­filhos de Dhṛtarāṣṭra, destacavam-se Duryodhana e Duḥśāsana. Os Pāṇḍavas e os Kauravas eram, então, primos.
       Com a morte prematura de Pāṇdu, Yudhiṣṭhira seu filho mais velho foi nomeado governante por Dhṛtarāṣṭra. Embora Dhṛtarāṣṭra desejasse nomear seu filho Duryodhana. Após várias tentativas de se livrar dos primos, Duryodhana desafiou os Pāṇḍavas para um jogo de dados e Yudhiṣṭhira, que jogou com dados viciados, perdeu tudo, as posses, o reino e a liberdade.
        Os Pāṇḍavas, segundo o trato, deveriam retirar-se na floresta por doze anos, e depois viver anonimamente na cidade por mais um ano, então poderiam ter o reino de volta. Os Pāṇḍavas cumpriram o trato e, passados os treze anos, voltaram para reclamar o trono que de direito lhes pertencia. Entretanto, Duryodhana negou-se a devolver seus direitos. Assim começa o Bhagavad Gita com Dhṛtarāṣṭra (o rei cego) perguntando a Sañjaya (que tinha a habilidade de ver à distância) o que ele via no campo de batalha.

Comentário de Abinava Gupta:
        "O primeiro capítulo, que é uma introdução ao restante do texto, começa com a introdução dos Pāṇḍavās e dos Kauravas, ou seja, do conhecimento e da ignorância na tentativa de um se sobrepor um ao outro. Existem dois tipos de pessoas neste mundo que não são capazes de receber instruções. Os primeiros são os ignorantes que não possuem a mínima quantidade de conhecimento. Os segundos são aqueles que eliminaram a ignorância em sua sua totalidade. Se um desses dois tipos receber instruções, essas instruções raramente darão frutos. Isso ocorre porque não é possível afastar alguém da posição em que está bem entrincheirado. O melhor candidato para receber instrução é uma pessoa que tem dúvidas sobre o tópico apresentado.
        O desacordo entre os elementos do conhecimento e da ignorância é chamado dúvida, e o objetivo da instrução é remover essa dúvida. Portanto, a Bhagavad Gita, que por si só é a instrução para alcançar a libertação, começa com a história que trata do conflito entre os deuses, que são produtos do conhecimento e os demônios. que são produtos da ignorância.
        Neste ponto. é importante destacar que conhecimento e ação não são iguais e, portanto, não podem ser colocados no mesmo nível. No caminho da libertação, o conhecimento desempenha um papel predominante enquanto a ação deve ser descartada. É por causa dessa superioridade do conhecimento que a ação mesmo daqueles que estão totalmente engajados nas atividades diárias não é uma conexão fundamental. Portanto. não há uma concomitância invariável entre conhecimento e ação.
         A respeito disso, vou explicar a exata intenção do sábio Vyasa em lugares diferentes ao longo do meu comentário. Qual propósito deve servir para a continuação da discussão sobre esse tópico particular? Falar demais só cria obstáculos no caminho da realização da realidade mais alta".

A Bhagavad Gita compreende 18 capítulos e está inserido no no Mahabharata.
       Parte 1
 Capítulo 1 (46 versos): A Bhagavad Gita é aberto estabelecendo o cenário do campo de batalha de Kurukshetra. Dois grandes exércitos representando lealdades e ideologias diferentes enfrentam uma guerra catastrófica. A guerra afeta Arjuna e ele questiona a moralidade da guerra. Ele se pergunta se é nobre renunciar e sair antes que a violência comece, ou deveria lutar e por quê?
      Parte 2 
Capítulo 2 (72 versos): O segundo capítulo inicia as discussões e ensinamentos filosóficos encontrados na Gita. O guerreiro Arjuna cheio de introspecção e perguntas sobre o significado e o propósito da vida, pergunta a Krishna sobre a natureza da vida, alma, morte, vida após a morte e se há um significado e uma realidade mais profundos.
        Parte 3
Capítulo 3 (43 versos): Alguns tradutores intitulam o capítulo como Karma Yoga. Arjuna, depois de ouvir os ensinamentos espirituais de Krishna no capítulo 2, fica mais confuso e volta à situação que enfrenta. Ele se pergunta se o combate à guerra "não é tão importante, afinal", dada a visão geral de Krishna sobre a busca da sabedoria espiritual. Krishna responde que não há como evitar a ação (karma), pois a abstenção do trabalho também é uma ação.
        Capítulo 4 (42 versos): Krishna revela que ele ensinou esse yoga aos sábios védicos. Arjuna questiona como Krishna poderia fazer isso, quando esses sábios viveram há tanto tempo, e Krishna nasceu mais recentemente. Krishna lembra a ele que todos estão no ciclo de renascimentos e, embora Arjuna não se lembre de seus nascimentos anteriores, ele lembra. Sempre que o dharma declina e o propósito da vida é esquecido pelos homens, diz Krishna, ele volta a restabelecer o dharma.
       Parte 4
Capítulo 5 (29 versos): O capítulo começa apresentando a tensão na tradição indiana entre a vida de sannyasa (monges que renunciaram a seus lares e apegos mundanos) e a vida de grihastha (chefe de família). Arjuna pergunta a Krishna qual caminho é melhor.
        Capítulo 6 (47 versos): O capítulo começa como uma continuação dos ensinamentos de Krishna sobre o trabalho desinteressado e a personalidade de alguém que renunciou aos frutos encontrados no capítulo.
        Parte 5
Capítulo 7 (30 versos): O capítulo 7 mais uma vez abre com Krishna continuando seu discurso. Ele discute Jnana (conhecimento) e Vijnana (realização, compreensão) usando a estrutura Prakriti-Purusha (matéria-alma) da escola Samkhya de filosofia hindu e a estrutura Maya-Brahman de sua escola Vedanta.
        Capítulo 8 (28 versos): O capítulo começa com Arjuna fazendo perguntas quem é Brahman e qual é a natureza do karma. Krishna afirma que sua natureza mais elevada é o Brahman imperecível, e que ele vive em todas as criaturas como o adhyatman.
        Parte 6
Capítulo 9 (34 versos): O capítulo 9 começa com Krishna continuando seu discurso enquanto Arjuna escuta. Krishna afirma que ele está em toda parte e em tudo de uma forma não manifestada, mas ele não é de forma alguma limitado por eles.
        Capítulo 10 (42 versos): Krishna revela seu ser divino em maiores detalhes, como a causa última de toda existência material e espiritual, alguém que transcende todos os opostos e que está além de qualquer dualidade. Krishna diz que ele é o atman em todos os seres, o Eu interior de Arjuna, também Vishnu compassivo, o Surya (deus do sol), Indra, Shiva-Rudra, Ananta, Yama, assim como o Om, sábios védicos, tempo, mantra Gayatri e a ciência do autoconhecimento. Arjuna aceita Krishna como o purushottama (Ser Supremo).
        Parte 7
Capítulo 11 (55 versos): A pedido de Arjuna, Krishna exibe sua "forma universal" (Viśvarūpa). Essa é uma ideia encontrada no Rigveda e em muitos textos hindus posteriores, onde é um simbolismo para o Atman (Self) e Brahman (realidade absoluta) que permeiam eternamente todos os seres e toda a existência.
         Capítulo 12 (20 versos): Neste capítulo, Krishna glorifica o caminho do amor e devoção a Deus. Krishna descreve o processo de serviço devocional (Bhakti yoga). O texto afirma que combinar "ação com renúncia interior" com o amor de Krishna como Deus pessoal leva à paz.
        Parte 8
Capítulo 13 (35 versos): Ele descreve a diferença entre o corpo físico transitório e perecível (kshetra) e a alma eterna imutável (kshetrajna). A apresentação explica a diferença entre ahamkara (ego) e Atman (Self), a partir daí entre a consciência individual e a consciência universal. O conhecimento do verdadeiro Self de alguém está ligado à realização do Atma.
        Capítulo 14 (27 versos): O capítulo mais uma vez abre com Krishna continuando seu discurso do capítulo anterior. Krishna explica a diferença entre purusha e prakriti, explicando as experiências humanas através dos três Guṇas (tendências, qualidades).
        Parte 9
Capítulo 15 (20 versos): Este capítulo discute a natureza de Deus, em que Krishna não apenas transcende o corpo impermanente (matéria), mas também transcende o Atman (Self) em todo ser. É mais complexo que outros versículos porque considera doutrinas dos Upanisads de natureza monística.
        Capítulo 16 (24 versos): Krishna afirma que veracidade, autocontrole, sinceridade, amor pelos outros, desejam servir aos outros, desapegar-se, evitar a raiva, evitar danos a todos os seres vivos, justiça, compaixão e paciência são marcas da natureza divina. O oposto deles é demoníaco, como crueldade, presunção, hipocrisia e ser desumano.
        Capítulo 17 (28 versos): Krishna qualifica as três divisões da fé, pensamentos, ações e até hábitos alimentares correspondentes aos três modos (gunas).

Nenhum comentário: